Recebemos
a visita, e se mantiveram o tempo todo conosco, nossos ancestrais, os mártires
e todos os que tombaram nas lutas antigas e recentes, em defesa da Vida. Foi
emocionante e de grande responsabilidade para nós, sentir a presença deles e de
suas grandes causas. Nós nos recusamos
esquecê-las, pois são causas em
prol de uma igreja e de uma sociedade nova e diferente. Oscar Romero, Josimo,
Dorothy, Nísio Guarani-Kaiowá, Flaviano, quilombola do Charco MA... nos
convidaram a olhar com fé para as novas sementes de resistência e de rebeldia
que teimosamente são plantadas em todo canto da Abya Yala, a Pátria Grande,
pelos povos indígenas, quilombolas, camponeses e camponesas de inúmeros
territórios e culturas.
De
fato, além destes, acompanhados por Cristo ressuscitado, entre outros entraram
na aldeia que nos hospedava:
os
Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul, expropriados de seus territórios e de sua
cidadania, massacrados, proibidos, alijados da convivência nacional;
- os quilombolas do Moquibom - MA, cerca de
80 quilombos que defendem e reivindicam os seus territórios, cercados pela
violência do latifúndio e do Estado;
- os quilombos do Recôncavo Baiano do Rio dos
Macacos e do São Francisco do Paraguaçu....
- os povos indígenas do Xingú impactados pelo
absurdo e autoritário projeto de Belo Monte;
- os jovens, a quem se fecham os horizontes
de uma vida digna e prazerosa no campo;
- os Guarani e sem terra do Paraguai que
lutam para retomar as terras, ocupadas ilegitimamente por latifundiários
brasileiros;
- Os indígenas da Bolívia que não aceitam e
impedem no TIPNIS (Território Indígena Parque Nacional Isidoro Sécure) a
construção de uma rodovia;
- Os campesinos de Honduras que, em Bajo
Aguán, ainda aguardam uma solução para não perder a terra...
A
narrativa viva que apareceu em nossos diálogos e em nossas reflexões
projetaram, em sua crueza, imagens que,
há muito tempo, estamos vendo e que a grande mídia quase não revela mais:
invasões, traições da palavra, explorações, violências permanentes contra
nossos irmãos quilombolas, ribeirinhos, pescadores, quebradeiras de coco,
camponeses, jovens e indígenas, migrantes assalariados e escravizados ...
Desta
terra depredada e de seus filhos resistentes, vemos renovar-se a cada dia,
reações e sinais de esperança. Para quem quer ver, são os sinais, do Reino, da
Terra sem Males, do Sumak Kawsay (o Bem Viver Quechua) que fermentam e aquecem
nossas lutas, nossas comunidades, nossas vidas.
Esta
é a hora, agora mais do que nunca, de tecer, com os fios da história, uma só
rede de solidariedade, resistência, teimosia e reação. Com a força dos
pequenos, do campo e das cidades, nas ruas e nas praças, de noite e de dia. O
sangue derramado pelos nossos irmãos e irmãs de luta, não foi e nem será em
vão. Este é para nós o Evangelho do Ressuscitado e esta é a mística que nos faz
acreditar na vitória de nossa pequena “pedra” (cfr. Daniel 2, 26-35) chamada
esperança, que nasce e renasce da terra e que lançaremos, cotidianamente,
contra o gigante dos pés de barro e em favor dos nossos irmãos. Esta pedra de
nossa esperança é eficaz quando, com nossos compromissos unitários,
reconhecemos e aceitamos a riqueza e a diversidade que o espírito de Javé faz
surgir entre os pobres. Isso, da parte de nossas pastorais missionárias,
implica
- aceitar sermos parteiros e parteiras de um
mundo novo através de formas novas de vivificar nossas igrejas e nossas
comunidades;
- exigir que o Estado deixe de iludir,
reprimir e violentar, com seus aparatos, os povos que não aceitam entrar na
estrutura desumana do capitalismo e dos seus
latifúndios;
- impedir que nossas terras e
territórios estejam cada vez mais
monopolizados pela mineração selvagem e os monocultivos;
- recusar, decididamente, a canga, sempre
renovada, de uma política que quer reduzir
os territórios de vida a novos feudos a serviço do lucro e transformando-os em novos currais eleitorais
para legitimar o poder concentrado;
- promover a participação e o protagonismo de
quem, uma vez despertado para o valor da cidadania, ameaça ser novamente
tolhido por uma democracia formal que mascara um autoritarismo e uma
dependência deprimente de marco neocolonial.
Sobre
nosso Brasil indígena, negro, camponês, sobre os jovens desta hora tão
ameaçadora e sobre todos os que se solidarizam com outro modelo de Brasil,
pedimos a benção do Deus de tantos nomes que Jesus veio nos mostrar com sua
missão que é também a nossa.
PARTICIPANTES DO ENCONTRO DAS
PASTORAIS BRASILEIRAS DO CAMPO
BRASILIA, 5 DE FEVEREIRO 2012
CIMI - Conselho Indigenista Brasileiro
CPT – Comissão Pastoral da Terra,
PJR – Pastoral da Juventude Rural
SPM – Serviço Pastoral dos Migrantes
CPP – Conselho Pastoral dos Pescadores
Caritas Brasileira
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