sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Governo do PSDB em Minas beneficia ICMS do setor de mineração


A politica do PSDB no  Estado de Minas, acaba de baixar decreto dando benefícios fiscais para as atividades de mineração. O artigo é de Daniel Santos Prado, advogado do departamento de Direito Tributário do escritório Décio Freire & Associados, publicado na Revista Consultor Jurídico, de 20 de dezembro de 2012. Veja o artigo:
Foi publicado nesta terça-feira (18/12) o Decreto 46.110, em que o estado de Minas Gerais, alterando o Regulamento do ICMS (Decreto 43.080/02), concede benefícios fiscais ao setor minerário. Essas benesses, conforme nova redação dada ao artigo 501 do RICMS, consistem em (i) adoção de novos critérios diferentes do disposto no artigo 43 do referendado diploma, para a determinação da base de cálculo nas operações interestaduais e; (ii) concessão de crédito presumido nas saídas tributadas de até 30% do valor destacado em documento fiscal, valendo observar que foi vedado o aproveitamento de outros créditos.
Tais concessões serão formalizadas por meio de regime especial, cujo requerimento está sujeito à análise da Superintendência de Tributação do Estado (Sutri). A sistemática será aplicada a todos os estabelecimentos da mesma empresa que exerçam atividade no ramo e, dependendo dos termos do regime, serão adotados valores ou critérios distintos do artigo 43 do regulamento por mercadoria, estabelecimento, período de apuração ou exercício. Além disso, o recolhimento do imposto não poderá ser inferior ao valor médio recolhido nos 12 meses anteriores à inscrição no regime.
Para que o contribuinte possa gozar dos benefícios concedidos pelo citado decreto, deverá cumprir uma série de requisitos (art. 503, RICMS), sendo um deles a nova apuração do imposto, utilizando a base de cálculo prevista no regime especial, nos cinco anos anteriores à sua vigência, para as operações interestaduais. Ademais, deve ser recolhida, de forma integral ou parcelada, a diferença do montante a ser pago após o resultado dessa apuração, devidamente acrescido de juros.
Entretanto, o requisito que mais se destaca é a obrigação de adimplir todos os débitos existentes, bem como o de desistir de eventuais questionamentos judiciais e administrativos quanto à Taxa Minerária (TFRM — instituída pela Lei Estadual 19.976/11).
Ora, a TFRM, que expressa nitidamente a sanha arrecadatória do Estado sobre a mineração exercida em seu território é, atualmente, objeto da ADI 4.785, ajuizada pela Confederação Nacional das Indústrias (CNI), que pretende ver declarada a inconstitucionalidade da norma mineira.
No mesmo sentido, há ações individuais movidas por contribuintes para afastar a incidência da taxa, que onera significativamente suas operações. Fica evidente, portanto, que a determinação de adimplemento e desistência de demandas judiciais ou administrativas quanto à TFRM para concessão de regime especial de ICMS sobre a atividade configura nítida sanção política que, em verdade, acaba por onerar o setor minerário.
Em outros termos, o Estado reconhece a fragilidade da norma que instituiu a Taxa Minerária e, com suposto beneficio aos contribuintes que abrirem mão de discuti-la, tenta diminuir o número de opositores. Todavia, é preciso destacar que na ADI 4.785, a Procuradoria-Geral da República emitiu parecer opinando pela parcial procedência dos pedidos, além da existência, como dito, de vários contribuintes, que em ações individuais, tiveram liminares deferidas para suspender a exigibilidade da TFRM, expondo a insubsistência do tributo em comento.
Portanto, a imposição de quaisquer ônus ao contribuinte que atua no setor minerário, para que possa usufruir dos benefícios concedidos pelo Decreto 46.110, beira a ilegalidade, o que é passível de questionamento judicial, até porque a ADI, pela fase processual, pode a qualquer momento ter uma decisão definitiva.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Deus derrama amor em nosso mundo em forma humana

Vá e olhe - e descubra o amor de Deus derramado em nosso mundo em forma humana

Esperança que reina por todo lado, no cosmos e nos corações humanos.

Se fez humano, criatura, no ventre de uma mulher do povo. Veio, numa pequena vila, na periferia do império de seu tempo. Nasceu numa ocupação de terra e em curral de outros. Por berço foi lhe dado um cocho. Na simplicidade,de uma família de trabalhadores, foi envolto em panos. Junto dos animais encontrou aconchego. Daqueles que por ali pastoreavam seus rebanhos em terras alheias, a primeira visita. Os pobres desse mundo reconhecem e acolhem sinais que aos poderosos passam despercebidos.

Demos graças e nos alegremos por uma criança: luz que nasce no meio de nós!

Abriu-se um relacionamento renovado entre a humanidade, Deus e todas as criaturas. O amor de Deus em forma humana, em forma de natureza, na fragilidade de uma criança, nos revela a grandeza das criaturas e a simplicidade - fragilidade de nosso Deus.

Deus está presente, onde Cristo está presente, encarnado no mundo e no cosmo. O Natal afirma que a natureza transborda o amor de Deus, e que nossa linguagem para com os outros e a natureza deve ser a do amor.

Feliz Natal

Frei Rodrigo Péret,ofm
Natal 2012

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Para entender o xadrez da política - 2

Autor: 
 
No dia 11 passado, Luis Nassif em seu blog  publicou o post "Para entender o xadrez da política".
Agora, Nassif faz um novo levantamento, à luz dos últimos episódios.

Como é o jogo de poder nas democracias

  1. Há três mundos distintos na opinião pública. Um, o mundo da chamada voz das ruas, que elege políticos, de vereadores a presidentes. O segundo, o mundo da opinião pública midiática, controlado por grandes grupos de comunicação. O terceiro, o mundo das instituições, onde se inserem os Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e as demais instituições constitutivas do Estado: Forças Armadas, Ministério Público, órgãos de controle, diplomacia etc. Importante: esse mundo, seja no plano das funções ou familiar, é influenciado majoritariamente pelo mundo da mídia.
  2. O mundo das instituições é fundamentalmente legalista e formalista, no sentido de seguir normas, regulamentos e leis. Há maneiras de dar by-pass na legalidade que seguem sempre o mesmo padrão: denúncias de corrupção, quebra da ordem econômica e social e, no caso de republiquetas latino-americanas, o fantasma da subversão. O clima de caos aumenta a sensação de vácuo de poder e alguém acaba ocupando. Meses atrás publiquei aqui um extraordinário artigo de Afonso Arinos de Mello Franco, de 1963. Ele próprio integrante da UDN, mostrava como a oposição manipulava conceitos que, em 1963, ele já via defasados: como o fantasma da Guerra Fria. E diagnosticava: se não houver pulso da parte do governo, termina em golpe militar. Não houve pulso, a conspiração prosperou e, depois, foi alimentada por manifestações de rua e comícios que passaram aos militares a ideia de quebra da hierarquia. 1964 foi fruto do vácuo de poder.
  3. A mídia sempre tem papel central nesses movimentos. Durante meses criam-se fatos verdadeiros ou não, escandalizam-se meros problemas administrativos (já que não se consegue produzir escândalos verdadeiros todo dia), martela-se, martela-se até obnubilar a opinião pública e consolidar a ideia do caos. As movimentações de rua são consequência e o melhor álibi para golpes. Se a favor, legitima-os para atender aos pleitos da opinião pública. Se contra, legitima-os para impedir a baderna.
  4. Em muitos episódios latino-americanos – quedas de Fernando Collor, no Brasil, e Carlos Andres Perez, na Venezuela - o golpe ocorreu via aliança Legislativo-Mídia. Em outros casos – tentativa de derrubada de Chávez – na aliança entre Mídia e setores das Forças Armadas. Em casos recentes, na parceria Mídia-Supremo. Em todos os casos, há o clamor da opinião pública legitimando os golpes.
  5. O atual embate STF x Congresso visa definir quem é a lei. Não se trata de episódio trivial, briga de egos e quetais. É briga de poder MESMO. Na eventualidade de um episódio crítico qualquer no futuro, quem conseguir ser a LEI manobrará todo o universo das corporações públicas. Se não houver esse momento crítico, cada personagem se recolherá novamente a seu papel tradicional e a disputa não terá passado de uma briga de egos. Melhor: de imensos egos.

As peças do jogo no quadro atual

Os pontos levantados  não significam que há uma organização conspiratória juntando todas essas peças. Deflagra-se um processo e são as circunstâncias específicas que determinam a dinâmica e conferem um papel a cada agente.
Entendidos esses aspectos genéricos do jogo de poder, vamos ao quadro atual:
  1. O PT é bom de rua, bom de voto e ruim de instituições. Quando Lula assumiu, tentou avançar através de dois operadores: José Dirceu e Antônio Palocci. A estratégia de Dirceu consistia em assumir todo o know-how de poder desenvolvido por FHC, o controle daquele grande rio subterrâneo do poder de fato, onde transitam os poderes constituídos, poderes econômicos, lobistas, parlamentares donos de bancada, técnicos e sistemas de influência em geral. No início do governo, ainda verde, essa estratégia levou o partido a “adotar” o esquema Marcos Valério, legítima criação do PSDB mineiro e que chegou ao Planalto através das mãos de Pimenta da Veiga, Ministro das Comunicações de FHC. Depois, aprendeu, mas o pecado original não pode ser exorcizado.
  2. O “mensalão” amarrou a ação de ambos os operadores, derrubou-os e, para afastar o fantasma do impeachment, Lula, inspirado por Márcio Thomas Bastos, apostou em um republicanismo ingênuo, no qual FHC jamais embarcou: não indicou o Procurador Geral da República, usou as indicações do STF (Supremo Tribunal Federal) para gestos simbólicos, descentralizou as ações da Polícia Federal. E deu todo o espaço político de que essas estruturas necessitavam para ambicionar mais espaço político. É movimento típico das burocracias . Quando não há nenhuma forma de resistência à sua expansão, a tendência é ocupar espaço. O quadro de quase confronto atual é resultado direto do vácuo de poder no sistema judiciário, muito mais do que de manobras conspiratórias.
  3. Com o vácuo, cada ator político – PGR, STF, setores internos da PF – pôde crescer livremente, sem resistências e sem risco. O PGR Roberto Gurgel acumulou seu poder empalmando em suas mãos (e no da sua esposa) todos os processo envolvendo personagens com foro privilegiado. A maneira como ministros do STF atuaram no “mensalão” – um comparando o partido do governo ao PCC, outro incluindo falas fora do contexto da própria presidência da República – é típica de quem, à falta de qualquer tipo de limites, deixa de supor e passa a acreditar piamente que é Deus
  4. Finalmente, a cobertura exaustiva do julgamento do “mensalão” calou fundo na classe média – e não apenas na midiática. Graças ao Jornal Nacional, entrou no imaginário das famílias, das crianças e dos velhos. Acredita-se em um mar de corrupção incontrolável embora nem se identifiquem bem quem são os atores.
  5. A lógica que vigorou até agora para Lula e o PT – a cada campanha midiática a resposta das urnas – vale para eleições, não para o jogo institucional que se arma.

Cenário da desestabilização

O que seria um cenário de desestabilização? Esses cenários não são planejados de antemão, mas frutos de circunstâncias que vão se somando até virar o rascunho do mapa do inferno. Mostra-se, aqui, uma situação limite hipotética.
1. Intensificação da campanha midiática em duas frentes: a denuncista e a econômica.
O “efeito-mensalão” será absorvido com as festas de fim de ano e um janeiro tradicionalmente morno. Haverá a necessidade de substituí-lo por outros temas candentes.
A “denuncista” em tese depende da disposição do PGR e de setores da PF de abrir inquéritos e vazá-los para a mídia amiga. Há um processo nítido de auto-alimentação entre mídia e o PGR. Vaza-se o inquérito, monta-se um estardalhaço; com base no estardalhaço tomam-se outras medidas que resultam em mais estardalhaço. Tem que se atuar sobre esse cordão umbilical.
A econômica dependerá fundamentalmente do desempenho da economia e, principalmente, dos dados do PIB no primeiro semestre. Como já alertei aqui, a crítica se concentrará na atuação da Petrobrás no pré-sal, nos financiamentos do BNDES e no PAC.
2. Reação intempestiva do PT e Lula levando a movimentos de rua, com possibilidade de conflitos.
Leve-se em conta que a cobertura do “mensalão” tirou do PT o monopólio da mobilização popular. Agora há espaço para marchas contra a corrupção e coisas do gênero.
3. Reações do governo que possam ser interpretadas como ameaça às instituições.
4. Supremo sob controle do grupo dos cinco dizendo que, agora, “eu sou a lei” e se impondo para conter o caos.

As estratégias de lado a lado

Entendidos os pontos centrais da disputa, vamos tentar avançar no que poderiam ser as táticas de lado a lado.
Da oposição, obviamente, é elevar a fervura da água. Para tanto, necessita manter acesa a parceria com o PGR e com setores serristas da Polícia Federal para garantir a alimentação de escândalos; e declarações bombásticas de Ministros do STF para dar solenidade às suposições. E investir tudo em escândalos permanentes, desses que permitem um vazamento por dia e duas declarações retóricas de Ministros do STF por semana.
Enquanto isto, tratar de alimentar o negativismo do noticiário econômico superdimensionando notícias negativas e minimizando as positivas.
Da parte do governo, o jogo é o oposto, é baixar a fervura. Significa o seguinte:
  1. Considerar finalizado o episódio “mensalão”. Para tanto, o PT terá que dar baixa no balanço das lideranças atingidas. Do mesmo modo, a Presidência se afastará cada vez mais do episódio e reforçará o legalismo. No início, a inação do Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, era coisa dele. Agora, não: é coisa dela.
  2. O MPF é permanente; Roberto Gurgel, passageiro. Como organização burocrática, disciplinada e legalista, bastará que seja tratado com respeito e que o governo emita sinais discretos sobre a sucessão de Gurgel, sem nada que afronte a autonomia relativa do órgão e sem nada que alimente as fantasias continuístas do grupo de Gurgel. Automaticamente se formarão novos centros de poder e influência internos.
  3. Em relação ao STF, o problema não é o órgão, evidentemente, mas a coalizão circunstancial que permitiu aos “cinco do Supremo” votar em bloco, em um STF desfalcado, e, com a hegemonia provisória, tornarem-se celebridades. Havendo normalidade na política e na economia - e acerto na substituição de Ministros - termina a maioria circunstancial, já que as Ministras, severas nas suas sentenças, mostraram-se discretas e legalistas. Celso de Mello voltará a se comportar como lente, Gilmar como político, Marco Aurélio como outsider, Luiz Fux buscará outras lâmpadas em torno das quais esvoaçar – bom radar porque especialista em rodear as lâmpadas que irradiam maior calor.  E Joaquim Barbosa… continuará sendo Joaquim Barbosa.
  4. No plano econômico, torcer para que venha logo a colheita das medidas plantadas nos dois últimos anos. E melhorar substancialmente as ferramentas de divulgação dos atos positivos de política econômica. O reajuste dos combustíveis foi passo importante para devolver à Petrobras o fôlego financeiro, tirando-a da linha de fogo.

Fatores de atrito

Há dúvidas no ar, obviamente. A manutenção de um clima de tranquilidade, com a economia sob controle, será relevante para que a nova formação do Supremo retorne à discrição e à responsabilidade institucional que se exige do órgão.
Gurgel e Joaquim Barbosa continuarão ativos. Manterão a parceria? São incógnitas.
A grande tacada da mídia serão as investidas contra Lula. Essas, sim, poderão provocar as manifestações de rua que se pretende para ampliar a percepção de caos político. No MPF, há uma gana para pegar Lula que transcende a própria figura do PGR.
É por aí que o bicho pode pegar. E é por aí que deverá se concentrar a atuação política dos que não pretendem assistir o país pegar fogo.
Nem se ouse apostas sobre quem pode botar mais gente na rua. Entrar nesse jogo é tiro no pé na certa.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

O STF não pode julgar a própria Constituição inconstitucional

De acordo com o Art. 102 da Constituição Federal (CF), cabe ao Supremo Tribunal Federal (STF) julgar se leis, decretos, normas e tratados estão de acordo com o texto constitucional.

Mas em nenhuma parte da CF está escrito que cabe ao STF julgar a constitucionalidade do próprio texto da Constituição. Nem poderia, pois se o STF tivesse esse poder de decretar que o texto da Constituição não vale o que está escrito, e sim a interpretação dos doutos ministros, o Tribunal viraria uma Assembléia Constituinte Revisional de 11 membros, e fascista, porque seria auto-proclamada por déspotas sem um único voto popular sequer, sem que o poder emane do povo.

O STF pode interpretar a constitucionalidade das leis infraconstitucionais, mas nunca pode interpretar a "constitucionalidade" de artigos da própria Constituição. Os ministros do STF devem rigorosa obediência à CF como está escrita.

E a Constituição Federal (CF) determina um rito a ser cumprido para cassar mandato de deputado federal.

Vejamos o primeiro passo:

"Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
...
III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;"

O STF condenou criminalmente alguns réus do mensalão com mandato de deputado. Logo pode declarar na sentença, se quiser, a consequente perda ou suspensão de direitos políticos. A CF manda parar aí. Daí para a frente o rito passa ao legislativo.

Vejamos o segundo passo:

"Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:
...
IV - que perder ou tiver suspensos os direitos políticos;
...
VI - que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado.
...
§ 2º - Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa.

§ 3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa."

O segundo passo, em qualquer circunstância, cabe à Câmara dos Deputados. Seja pela Mesa da Casa, seja por voto secreto no plenário. Nos dois casos, assegurada ampla defesa.

Portanto, para um processo de cassação de mandato ter legitimidade Constitucional, precisa seguir este rito. Está escrito em bom português na CF, sem deixar margem de dúvida de que o rito a ser seguido é este.

No entanto, causa calafrios, só sentidos na época dos Atos Institucionais da ditadura, ver ministros do STF defendendo suprimir estes ritos, "interpretando" de forma imprópria a "constitucionalidade" dos artigos 15 e 55 da CF.

O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS) está certo em dizer que seguirá a Constituição, ignorando atos que a desrespeitem. Se ministros do STF ameaçarem membros do poder legislativo por estarem cumprindo a Constituição, a própria CF determina que cabe ao Senado abrir processo contra ministros STF.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Projeto na Câmara pretende acabar com o rótulo nas embalagens de alimentos transgênicos.


Está pronto para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 4148/2008, que elimina a rotulagem obrigatória de alimentos com menos de 1% de matéria-prima transgênica em sua composição. O texto, de autoria do deputado federal Luis Carlos Heinze (PP-RS), causa polêmica entre consumidores e entidades da sociedade civil, que defendem a indicação em todos os produtos compostos por ingredientes geneticamente modificados, independentemente da porcentagem. Se aprovado, o projeto segue para apreciação do Senado, onde poderá sofrer modificações. Matéria de Anna Beatriz Lisbôa, noCorreio Braziliense, socializada pelo ClippingMP.
Além de estabelecer o limite mínimo para o símbolo de transgênicos nas embalagens, a matéria tira a obrigação de rotulagem para produtos de origem animal produzidos a partir de espécies alimentadas com ração transgênica, exclui o atual símbolo de alerta para a presença de organismos geneticamente modificados — a letra “T” no centro de um triângulo amarelo —, bem como a informação sobre a matriz doadora do gene. A intenção do projeto é reverter a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que, em agosto deste ano, julgou obrigatória a rotulagem dos bens que contenham ingredientes primários alterados.
De acordo com o autor, Luis Carlos Heinze, o texto é uma adaptação à realidade brasileira, que não permite a fiscalização da porcentagem de organismos geneticamente modificados em todos os produtos. “Não há como fazer isso por causa da diversidade alimentícia produzida pelo Brasil. O Ministério da Agricultura não tem como fazer esse controle”, afirma Heinze. “Nos casos de níveis ínfimos de transgênicos, é preciso ter laboratórios muito apurados que façam exames e a maioria deles está nos grandes centros.”
Para Heinze, o projeto colocaria o Brasil de acordo com legislações internacionais. “Na Europa, por exemplo, o produto só é rotulado quando tem acima de 0,9% de organismos geneticamente modificados.” O parlamentar também defende que o atual símbolo das embalagens seja substituído por uma das seguintes expressões: “(nome do produto) transgênico” ou “contém (nome do ingrediente) transgênico”. “A maioria dos consumidores não consegue associar o ‘T’ a transgênicos”, justifica. Apesar de constar nas embalagens desde 2003, o “T” ainda passa desapercebido pela maioria dos consumidores. “Acho que deveria ter uma identificação melhor. Nunca reparei no símbolo”, revela a analista de sistemas Rosemeire Alves, 46 anos.
Precaução
A presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Maria Emília Pacheco, defende o princípio da precaução em relação aos alimentos transgênicos. “Foram divulgados vários estudos que mostram as consequências dos organismos geneticamente modificados para o meio ambiente e para saúde. Nesse contexto, é fundamental que haja rotulagem para atender o direito à informação do consumidor e exercitar o princípio da precaução.” Dados do Ministério da Agricultura mostram que atualmente soja, algodão e milho transgênicos representam respectivamente, 80%, 30% e 60% da produção nacional dessas culturas.
Para o pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) João Paulo Amaral, a falta de identificação da espécie doadora do gene poderia trazer insegurança para os consumidores. “Caso ocorra alguma pandemia, como houve no Japão e nos Estados Unidos, por causa de algum produto transgênico, não conseguiríamos tirá-lo de circulação”, explica.
O presidente do Conselho Nacional de Nutricionistas, Élido Bonomo, alerta que o maior risco desses alimentos é a falta de informações sobre a dimensão dos efeitos que eles podem causar. “Como se faz a alteração genética das plantas, gera-se um novo produto, e não sabemos como ele vai reagir no organismo das pessoas. Para liberar os alimentos para consumo, seria necessária uma análise a longo prazo, mas estão liberando com apenas três meses de estudo”, lamenta.
Aumento de alergias
De acordo com o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), os transgênicos podem oferecer riscos à saúde, entre eles, crescimento da incidência de alergias e aumento da resistência a antibióticos. Em 1999, o Instituto de Nutrição de York, Inglaterra, por meio de pesquisa, constatou o aumento de 50% em alergia a produtos à base de soja. De acordo com estudo, o resultado estava relacionado ao consumo de soja geneticamente modificada. Nos Estados Unidos, reações em pessoas alérgicas impediram a comercialização de uma soja que possuía gene de castanha-do-pará.
FONTE:ECODEBATE

sábado, 15 de dezembro de 2012

Quem lucra com a VALE?

Reportagem é de Ana Castro e publicada no portal Agência Pública
Os principais processos judiciais, em termos de valores, estão relacionados à cobrança do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). A disputa com a Receita Federal envolve a cobrança de R$ 30,6 bilhões e gira em torno do pagamento de imposto sobre o lucro que empresas da Vale tenham tido no exterior, dentro da compreensão do Artigo 74 da Medida Provisória 2.158-34/2001. Esse artigo afirma que, para determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, os lucros de empresas controladas ou coligadas no exterior “serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apurados”.

Antes mesmo de ser cobrada pela Receita Federal, em 2003, a Vale entrou com mandado de segurança na Justiça Federal, para questionar esse artigo da MP, inclusive considerando-o inconstitucional. Além desse mandado de segurança, a Valeresponde por processo administrativo por quatro autos de infração, instaurados pela Receita Federal para cobrança do IRPJ e CSLL.

Todos esses processos encontram-se suspensos por medida cautelar, ajuizada pela Vale, no Supremo Tribunal Federal (STF), depois de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em maio de 2012, ter permitido à Fazenda cobrar os valores devidos pela empresa. No dia 9 de maio, o ministro Marco Aurélio Mello concedeu a liminar a favor da empresa, considerando que o STF precisa julgar em plenário a validade do citado artigo 74, questionado por diversas empresas, além da Vale. Segundo informações do site do STF, ainda não há data para esse julgamento.

Não é apenas no Brasil que a Vale contesta o pagamento de impostos sobre o lucro de suas parceiras no exterior. Desde 2006, a mineradora tem um escritório em Saint-Prex, Suíça, aberto sobre a alegação de auxiliar na participação em sociedades no exterior, comercializar seus produtos, manter relacionamento mais próximo com os clientes, prestar serviços financeiros, administrativos e legais a outras sociedades e empresas do grupo, entre outras atividades.



Para se instalar na região, a Vale fez um acordo com autoridades do Cantão de Vaud, região suíça onde fica Saint-Prex. Segundo informações da assessoria de comunicação da Vale, a empresa tem recebido, desde o ano de sua instalação, “isenção de 100% dos tributos cantonais e locais e exoneração de 80% dos tributos federais por um período de cinco anos, renováveis por mais cinco anos”. A referida disputa é justamente sobre a aplicação de isenção de imposto de renda corporativo, os 80% do tributo federal. Isso porque a isenção básica é de 60% mas, se certas condições forem cumpridas, pode chegar a 80%.

Vale vem aplicando a isenção de 80% no imposto de renda corporativo, desde 2006, por entender que as condições impostas para isso (criação de empregos, construção do prédio em Saint-Prex e parcerias com universidades da região) estão sendo cumpridas. Mas não é esse o entendimento da Justiça Suíça. A Pública teve acesso à última sentença proferida pelo Tribunal Federal Suíço, em 28 de agosto de 2012, sobre recurso impetrado pela Vale contra uma decisão que revia e aumentava o valor de imposto devido, de 2007 a 2009.

Em dezembro de 2011, o Gabinete do Imposto sobre as Sociedades do Cantão de Vaud, Administração Cantonal, emitiu as decisões sobre o imposto devido pela empresa para esses três anos, e o Governo Suíço recorreu dessas três decisões. Por isso, em 22 de março de 2012, a Administração Cantonal emitiu três novas decisões, substituindo as de dezembro de 2011 e dobrando o valor cobrado, chegando a um total de US$ 226 milhões, alegando que as condições para a isenção de 80% no imposto não haviam sido cumpridas.

Em julho de 2012, a Vale interpôs recurso de direito público para a Justiça Federal da Suíça, alegando ter havido violação do direito de ser ouvida e que haveria ocorrido uma violação das regras do procedimento e uma aplicação arbitrária da lei. O recurso foi rejeitado em todas as suas alegações, e o tribunal cobrou da empresa o pagamento dos custos do processo, fixados em 60 mil francos suíços, em torno de R$ 130 mil.

Uma das suspeitas de problemas com a Vale é que ela esteja transferindo de forma irregular lucros de todas suas atividades pelo mundo para a Suíça, exatamente por se beneficiar dessa isenção de impostos. Dessa forma, estaria quebrando o compromisso firmado para ter acesso ao benefício fiscal. Segundo o Conselho da Prefeitura de Lausanne, que fica no Cantão de Vaud, a Vale pagou R$ 612 milhões em impostos de 2006 a 2010. De acordo com o formulário de referência de 2012, a Vale Internacional S.A., com sede na Suíça, tem um valor contábil de R$ 43,8 bilhões, muito superior ao de outras controladas no exterior, como as da Áustria ou do Canadá, por exemplo, que valem R$ 7,85 bi e R$ 9,74 bi respectivamente.

Outra questão que se coloca é que a Vale Internacional começou a incorporar diversas filiais anteriormente instaladas em paraísos fiscais e passou a registrá-las na Suíça, como mostra documento da Junta Comercial de Vaud. São as empresas: RDIF Overseas LTD, que veio das Bahamas; CVRD Overseas AS, das Ilhas Cayman; Brasamerican Limited, de Bermudas. A própria Vale International S.A. era uma empresa que tinha razão social registrada como Itabira Rio Doce Company Limited, com base em Nassau, Bahamas, tendo sido inscrita pela primeira vez em dezembro de 1996, meses antes da privatização da então Companhia Vale do Rio Doce.

Sobre a briga judicial na Suíça, a Vale afirmou, por meio de sua assessoria: “Os processos que tratam do mérito não estão concluídos e, portanto, não há decisão final sobre o pagamento de qualquer valor extra”. A empresa ainda cita uma afirmação creditada ao chefe da Administração de Impostos de Vaud, Philippe Mailard: “Por enquanto, tratamos da questão de procedimento. Agora que o Tribunal Federal se pronunciou, vamos continuar para definir a questão de fundo”. A empresa diz ainda que “cumpriu todos os compromissos assumidos com a Suíça” e que “permanece disposta a fornecer as explicações solicitadas, a dialogar com o Governo para encontrar uma solução conjunta caso seja necessário e a buscar na Justiça o cumprimento dos acordos que a levaram a estabelecer-se no país”.

Lei Kandir

Vale, como tantas outras empresas, é isenta de diversos impostos para exportação. Para a mineradora, essa é uma vantagem enorme, mas nem tanto para o país e para os estados de origem da extração mineral, que deixam de ganhar muito dinheiro. No caso dos impostos estaduais, desde 1996, com a aprovação da chamada Lei Kandir (Lei Complementar n°87), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal fonte de arrecadação dos Estados, deixa de valer para as exportações de alguns produtos, dentre eles os minerais. Os tributos federais dos quais esses produtos são isentos são: Imposto sobre Exportação (IE), Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI ), Imposto sobre Operações Financeiras (IOF, que pode ter alíquota zero ou ser compensado quando o exportador contratar operações com derivativos) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e PIS/Pasep, que podem ser ressarcidos.

São tantas isenções que é difícil calcular quanto o Brasil deixa de arrecadar no total. Mas, podemos saber o quanto a Valerecebeu no último ano com a exportação dos chamados bulks materials, o carro-chefe da mineradora: minério de ferro, pelotas, manganês, ferroligas e carvão. A receita operacional com as exportações destes produtos foi de US$ 39,6 bilhões em 2011, cerca de 65% da receita total da mineradora. No mesmo período, a empresa pagou US$ 1,39 bilhão de impostos sobre vendas e serviços, em todo o mundo.

Por causa das isenções nas exportações, o Brasil é considerado um país altamente rentável para a mineração, conforme revelou um estudo de Brian Mackenzie, geólogo da Universidade de Queen´s, em Ontario, Canadá. Segundo ele, o Brasil tem uma das cargas tributárias mais baixas do mundo para o setor, em torno de 39%, sendo que, na maior parte dos países produtores, Canadá, Austrália, América do Sul, a carga é de 50% ou mais.

Entre os impostos que não são eliminados, estão os encargos trabalhistas, além de, teoricamente, já que nem todas as prefeituras as cobram, taxas municipais. Já o IRPJ e a CSLL, a Vale paga, mas contesta os valores cobrados na Justiça, como se viu.

A empresa também tem que pagar a Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), os royalties da mineração, com uma alíquota que varia de acordo com o mineral e que é distribuída entre União (12%), Estado (23%) e município de origem da extração (65%). Essa compensação financeira foi instituída pela Constituição de 1988, sobre os chamados “bens da União”. Uma lei posterior, de 1990, definiu que o cálculo da alíquota da CFEM deve ser feito sobre o total das receitas de vendas, excluídos os tributos sobre comercialização, despesas com transporte e seguro. Mas, até hoje, a Vale e o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) não chegaram a um acordo sobre os valores a serem pagos. Entre os processos envolvendo tributos, a CFEM é a que envolve o maior número de disputas em que a Vale está envolvida: são 52 ações judiciais e 145 processos administrativos.

“Maximixar valor”

Nascida em 1942, a partir da nacionalização de uma companhia inglesa que atuava em Minas Gerais e do compromisso de fornecer ferro na 2ª Guerra Mundial, a Vale, hoje, é uma gigante global. Apenas em 2011, teve uma receita líquida de R$ 103,2 bilhões. É a segunda maior empresa de metais e mineração do mundo, e a principal produtora mundial de minério de ferro. Além do ferro, explora manganês, níquel, cobre, alumínio, cobalto, ouro, prata. Trabalha, ainda, com fertilizantes e energia (hidrelétricas, óleo e gás natural). Além disso, desde há várias décadas, mantém uma rede logística enorme, que atualmente conta com ferrovias, portos e terminais marítimos.

Além do Brasil, a Vale explora minas em 27 países e está presente, ao todo, em 37 nações, com escritórios, joint ventures (associações em projetos), pesquisa e prospecção. De acordo com o relatório anual da Vale de 2011, no ano passado a China respondeu por 32,4% da receita operacional bruta da empresa, ou seja, US$ 20 bilhões.

“Nosso principal objetivo é maximizar valor para os acionistas”. A frase está no FactSheet da Vale, uma espécie de resumo dos valores da empresa e de seus resultados. Ali também ficamos sabendo que, segundo o Boston Consulting Group, consultoria que é líder mundial em estratégia de negócios, a mineradora foi escolhida como uma das “25 maiores geradoras de valor sustentável aos acionistas no mundo”.

E a empresa tem cumprido bem o objetivo a que se propõe. Nas palavras de Pedro Galdi, analista da investimento da Corretora SLW, “a Vale vale”. “A mineradora tem uma das melhores políticas de distribuição de rendas do mercado. Eles distribuem metade do lucro líquido e ainda pagam dividendos adicionais em alguns anos”, comenta ele.

Os cerca de 400 mil acionistas, cujos nomes ou perfis a empresa não divulga, estão em todos os continentes, já que a Valetem ações negociadas em lugares tão diversos como as bolsas de São Paulo, Nova York e Hong Kong. Segundo dados da própria empresa, em 2011 houve um retorno recorde aos acionistas de US$ 9 bilhões, de um lucro líquido total de US$ 22,6 bilhões. Este ano, o desempenho da empresa diminuiu, com a queda do preço do minério de ferro, seu principal produto. Em 2012 foram pagos US$ 6 bilhões aos acionistas.

A empresa se tornou privada em 1997, depois de um leilão até hoje questionado na Justiça. Atualmente, a estrutura acionária dela é composta da seguinte maneira, para os acionistas com direito a votos em assembleia: a Valepar detêm 52,7% das ações ordinárias; a BNDESPAR, subsidiária do BNDES, tem 6,7%; o Aberdeen Asset Managers Limited (grupo global de gestão de investimentos, baseado na Escócia) tem pouco menos de 1% das ações ordinárias, e os diretores e executivos da Vale, como um grupo, também possuem pouco menos de 1 % das ações ordinárias. Assim, a Valepar é a controladora da empresa.

Os principais acionistas da Valepar são os fundos de pensão do Banco do Brasil (Previ), Petros, Funcef, Fundação Cesp, reunidos na Litel Participações S.A., que detêm 49% das suas ações ordinárias. Além da Litel, também são acionistas daValepar e, portanto, controladores da Vale, a Bradespar, companhia de investimentos do grupo Bradesco, com 21,21% das ações ordinárias, Mitsui, empresa de origem japonesa, com 18,24%, Eletron S.A., uma empresa do grupo Opportunity, da família Dantas, com 0,03%, e o BNDESPAR, que também tem ações da Valepar, 11,51%.

Portanto, o Estado brasileiro está presente no controle da Vale S.A., por meio do BNDESPAR, que tem ações ordinárias daVale e da própria Valepar, assim participando do lucro distribuído aos acionistas. O governo brasileiro possui 12 ações de classe especial, as chamadas golden share. Segundo relatório da Vale, de 2011, as golden share são ações preferenciais que, além de darem direito a voto e prioridade no recebimento de dividendos, permitem o veto a questões como mudança do nome e localização da empresa; no objeto social, no que se refere à exploração mineral; liquidação da sociedade; venda ou encerramento de atividades ligadas ao minério de ferro, como minas, jazidas, ferrovias, portos e terminais marítimos. No caso da Vale, essas ações golden share foram criadas durante o processo de privatização da empresa, em 1997.

Funcionalismo estatal


Em outubro, o Conselho Administrativo da Vale ganhou novo presidente, Dan Conrado. Funcionário de carreira do Banco do Brasil, advogado, começou na empresa como menor aprendiz em 1980 e hoje é o presidente da Previ, o maior fundo de pensão da América Latina.

Como a Previ é o maior acionista da Litel S.A., e consequentemente da Valepar, em geral seu presidente é indicado para o conselho administrativo da mineradora. Dan Conrado vem para substituir Ricardo Flores, presidente da Previ até maio que, em setembro, assumiu o comando da Brasilprev, empresa de previdência complementar controlada pelo Banco do Brasil. Tentamos marcar uma entrevista com Dan Conrado, mas, segundo a assessoria de imprensa da Previ, ele ainda não se pronunciou como presidente do conselho da Vale e, enquanto não o fizer, não dará entrevistas.

Segundo a Vale, ao todo são 11 membros do conselho eleitos na assembleia geral dos acionistas. Há representantes dos trabalhadores da empresa, da Mitsui, da Valepar, Bradespar/Bradesco. Além de Dan Conrado, um segundo membro do conselho, José Ricardo Sasseron, também é da Previ, onde atua como diretor de Previdência Social.

Já representantes do setor público são três: Robson Rocha, vice-presidente de gestão de pessoas e desenvolvimento sustentável do Banco do Brasil; Nelson Henrique Barbosa Filho, secretário executivo do Ministério da Fazenda; Luciano Coutinho, atual presidente do BNDES, maior financiador da Vale.

A Vale conta com diversas linhas de crédito e financiamento em todo o mundo, mas o maior crédito, de uma única instituição, foi dado pelo BNDES. O empréstimo, de R$ 7,3 bilhões , foi assinado em abril de 2008, meses depois deLuciano Coutinho, presidente do banco, assumir um posto no Conselho de Administração da Vale. Na época, Coutinhochegou a declarar, segundo os jornais: “Trata-se da maior linha já disponibilizada pelo BNDES para uma empresa só”. Uma das condições do empréstimo é que esse valor só poderia ser investido no Brasil, por cinco anos (prazo que termina agora em 2012).

A maior parte desse dinheiro está sendo investida no aumento da capacidade de extração de minério de ferro na região de Carajás, projetos Carajás 40 MTPA e Serra Sul S11D, que pretendem mais do que dobrar a produção local. E também na duplicação da Estrada de Ferro Carajás. Todos projetos que têm como objetivo final a exportação de minério de ferro.

O BNDES tem como uma das principais fontes de recurso o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A arrecadação do Programa de Integração Social (PIS) e do Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) de todos os trabalhadores foi destinada a esse fundo. A lógica nessa vinculação é que esse dinheiro sirva para apoiar projetos que gerem empregos, criando novas oportunidades para os trabalhadores.

“A cada emprego na extração mineral, quatro a cinco empregos diretos são gerados nas cadeias de transformação mineral a jusante. A exportação de minérios em forma bruta gera, proporcionalmente, menos emprego e renda, deixando o País mais vulnerável às flutuações dos preços internacionais. A consequência mais direta é a exportação de empregos e oportunidades em potencial para outros países”, diz o texto do Plano Nacional da Mineração 2030, documento doMinistério de Minas e Energia que traça as perspectivas para esse setor da economia para as próximas duas décadas. Baseando-se em dados de 2008, o plano chega ao seguinte resultado: as exportações brasileiras de minério de ferro bruto resultam em 680 mil empregos exportados.

Em uma nota da própria assessoria de imprensa do BNDES, em 2008, o banco dizia que, com os recursos que a Vale planejava investir, a empresa deveria aumentar o número de postos de trabalho em 62 mil novos empregos. Naquele ano, segundo o BNDES, a Vale tinha cerca de 152 mil empregados, entre diretos e indiretos. Hoje, cinco anos depois, a Vale tem 139 mil trabalhadores, segundo informa seu site.

Os projetos de siderurgia, considerados os grandes geradores de emprego na cadeia produtiva da mineração, quase não aparecem nos planos da Vale. Segundo informou a assessoria de imprensa da mineradora, apenas uma siderúrgica, a Companhia Siderúrgica do Pecém (CSP), no Ceará, foi aprovada pelo Conselho de Administração e recebeu investimentos em 2012. Outras grandes promessas estão paradas ou foram canceladas, como é o caso da Aços Laminados do Pará (Alpa), que seria construída em Marabá (PA). Já a Companhia Siderúrgica Ubu (CSU), no Espírito Santo, aguarda a definição de um sócio.

Investimento na mineração

O governo brasileiro trabalha com a expectativa de crescimento para a mineração. O Ministério de Minas e Energiapublicou no ano passado o Plano Nacional de Mineração (PNM), um documento de quase duzentas páginas, em que descreve as perspectivas para o setor até 2030. O trabalho serviu como base para o projeto de lei que deve definir um novoMarco Legal para a Mineração.

Atualmente, o texto está em avaliação dentro do governo, e o Ministério de Minas e Energia e a Casa Civil não têm divulgado o documento. Enquanto o novo marco não se torna público, podemos ter uma ideia do planejamento do governo para a mineração por meio do PNM 2030. E esses planos interessam à Vale, como a maior mineradora do Brasil e da América Latina.

A previsão do MME é a de que aumentará de três a cinco vezes a produção mineral no país, de acordo com o crescimento da demanda pelos recursos minerais, tanto no Brasil como no exterior. O governo pretende contribuir com esse aumento com a ampliação do conhecimento geológico nacional. Aparentemente, o setor mineral como um todo não tem grande presença na economia brasileira: representa 4,1% do PIB brasileiro, ficando à frente apenas de dois outros setores, dentre os 14 que compõem o indicador. O perfil é outro se observamos a participação do setor na geração de saldo comercial: nesse quesito, a mineração vem em primeiro lugar.

Como incentivar um setor exportador de matéria-prima a investir dentro do país? O Secretário de Geologia, Mineração e Transformação Mineral, Carlos Nogueira, do MME, admite o problema: “Há preocupação do governo em incentivar e propiciar cada vez mais a verticalização da produção e não ficar dependente da exportação de recursos naturais primários. As ações do poder público irão diminuir essa dependência quanto às commodities e propiciarão a exportação de produtos semiacabados e acabados”.

O que não está claro é se serão mantidas as isenções fiscais, que hoje incentivam empresas como a Vale a exportar empregos, como se viu. Segundo o secretário, para que seja possível a mudança no perfil do setor, o governo “irá manter o apoio a projetos de infraestrutura, buscará aprovação de uma nova legislação, menos burocrática e mais justa, bem como manterá os diversos programas de incentivo ao desenvolvimento do setor”.

“O governo aposta na expansão da atividade mineral, mas sem consultar a população”, diz Rodrigo Salles Santos, sociólogo da Universidade Federal de Juiz de Fora, especializado em mineração. O problema, para Santos, é que o local onde existe extração mineral não recebe outros incentivos. “A mineração drena recursos que estariam em outros setores, como o turismo, por exemplo. O dinheiro é usado para a infra-estrutura da mineração, sem construir alternativas. E quando a mina se encerra, tem uma economia dependente dessa fonte que acabou e não tem alternativa”.

O governo diz estimular “ações, através de políticas públicas, de modo que, tão logo cessem as atividades de mineração, permaneça um legado duradouro de atividades econômicas diversificadas, como educação, desenvolvimento de habilidades voltadas às necessidades das comunidades envolvidas, saúde pública e áreas reabilitadas. Desse modo, a mineração converte o valor intrínseco de um mineral no subsolo em recursos e na capacidade que permita à própria comunidade se estabelecer conforme os seus desejos”.
FONTE: AGENCIA PÚBLICA