A coordenação nacional da CPT divulga Nota sobre as últimas
declarações da ministra Gleise Hoffman, em relação aos povos indígenas, em
claro desrespeito ao que defende a Constituição Brasileira. Além disso, a
coordenação da CPT mostra preocupação em relação às recorrentes investidas do
capital e do governo contra os povos originários, de maneiro a deslegitimar
suas crenças, enfraquecer sua organização e tentar expulsá-los de seus
territórios. Confira o documento:
A Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra vem a
público para manifestar sua indignação e repúdio ao que faz o atual governo
federal, em defesa da sua visão monocrática de desenvolvimento e de submissão
aos interesses do agronegócio.
A ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffman, no dia 8 de maio,
em reunião da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, deixou claro
qual é a verdadeira e única visão do atual governo em relação aos sérios e
graves conflitos que envolvem os povos indígenas.
As diversas manifestações indígenas que vêm ocorrendo nos
últimos anos, que mostram sua total discordância com projetos que afetam sua
vida e seus territórios, são atribuídos pela ministra a grupos que usam o nome
dos índios, tentando, com isso, desqualificar suas ações como se eles apenas fossem massa de manobra nas mãos de outros
interesses. “Não podemos negar que há grupos que usam os nomes dos índios e são
apegados a crenças irrealistas, que levam a contestar e tentar impedir obras
essenciais ao desenvolvimento do país, como é o caso da hidrelétrica de Belo
Monte”, disse ela textualmente. E acrescentou: “O governo não pode concordar
com propostas irrealistas que ameaçam ferir a nossa soberania e comprometer o
nosso desenvolvimento”. A ministra deixa
patente que o econômico é o único compromisso do atual governo. Nada pode
impedir que os propalados “progresso e desenvolvimento” avancem sobre novas
áreas, desconhecendo totalmente os direitos dos povos que há séculos ali vivem
e convivem, se assim o governo definir como essenciais ao desenvolvimento.
Com essa fala, ela acaba por legitimar toda a violência
empreendida contra os povos originários no país. E confirma que o atual modelo
de “desenvolvimento” é o mesmo que se implantou no Brasil, desde a época do
Brasil Colônia, e se repetiu nos diversos períodos de nossa história.
Esquece-se ela, porém, que a Constituição, em seu artigo 231 garantiu: “São
reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e
tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente
ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os
seus bens” e que o Brasil é signatário de acordos internacionais que corroboram
estes direitos. As declarações da ministra soam como uma afronta à Constituição
brasileira.
E não são só palavras. Para garantir que as obras que o
governo se propõe realizar não sejam interrompidas, como nos tempos da ditadura
militar, militariza-se a questão. Em 12 de março, a Presidente Dilma assinou o
Decreto nº 7957/2013, que dá poderes ao próprio governo federal, através de
seus ministros de Estado, para convocar a Força Nacional em qualquer situação
que avaliarem necessário. E lá está a Força Nacional na região onde se pretende
construir o complexo Hidrelétrico do Tapajós. E estava em Belo Monte para
retirar os cerca de 200 indígenas de 8 etnias diferentes, que ocupavam o
canteiro de obras da usina, depois que o governo conseguiu liminar da justiça
para que os mesmos fossem retirados, até mesmo com o uso da força.
Pacificamente como entraram, os indígenas deixaram o local.
E não fica só nisso. Nas regiões, onde os índios depois de
decênios de espoliação, tentam reaver pequena parte do território que lhes
pertencia, o Palácio do Planalto desqualifica os trabalhos da Funai propondo
submeter os estudos de identificação e delimitação de terras indígenas à
análise da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), contrariando,
mais uma vez a legislação brasileira.
Aliado a isso tudo, a campanha anti-indígena que se
desenvolve no Congresso Nacional com a PEC 215, que quer transferir as
atribuições constitucionais da Presidência da República em reconhecer
territórios indígenas e de outras comunidades tradicionais para o Senado, e a
portaria 303 da Advocacia Geral da União que pretendia estender a todo o
Brasil, as condicionantes definidas para a TI Raposa Serra do Sol, nos dão um
quadro de como, depois de cinco séculos, os indígenas são vistos e tratados
neste país.
A Coordenação da CPT espera que nossa Constituição seja
respeitada em primeiro lugar pelo próprio governo, garantindo “aos índios sua
organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos
originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, e também sobre os
territórios dos quais foram espoliados. A preocupação da CPT se dá, também, com
relação aos quilombolas e outras comunidades tradicionais sobre as quais cresce
a pressão do capital, apoiado pelos poderes públicos. É hora de respeitar e de garantir a
diversidade presente em nosso país, e o espaço físico para reprodução física e
cultural dos povos e comunidades existentes.
Goiânia, 13 de maio de 2013.
Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
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