Quem imaginaria que 25 anos
depois daquela difícil mas gloriosa vitória dos povos indígenas e setores
progressistas da sociedade, com avanços significativos e conquistas de direitos
sociais garantidos durante o processo Constituinte, teríamos um quadro de
mobilizações para impedir retrocessos. Sonhávamos com um cenário bem diferente:
os direitos conquistados consolidados, rumo à construção de uma sociedade mais
justa, na pluralidade de seus povos e culturas, democracia participativa e
comunitária, não apenas representativa, formal e injusta.
Os guerreiros indígenas voltam à cena, ao
espaço do poder, no planalto central. Exigem que não retirem seus direitos da
Constituição: “Senhores do poder, cumpram a Constituição e não a rasguem, não
desonrem o país. Não manchem a imagem da nação. Nossos direitos são sagrados e
sob nenhuma hipótese podem ser violados”.
O espartano grito de guerra e paz dos Kayapó e
centenas de povos indígenas, encheram o espaço do Centro de Formação Vicente
Cañas, onde se reuniram mais de mil indígenas que, na madrugada do início de
outubro, acamparam na Esplanada dos Ministérios para fazer ouvir o seu grito,
nacional e mundialmente. A chuva fina não tirou o ânimo dos guerreiros que em
pouco tempo construíram a grande aldeia plural no coração do poder, no planalto
central.
Conquistas e retrocessos
Quando, há 25 anos, Ulysses
Guimarães, presidente do Congresso Constituinte, declarava aprovada a nova
Constituição, consagrava uma Carta Magna, na qual, pela primeira vez os povos
indígenas conquistaram importantes direitos sobre seus territórios e recursos
naturais e na sua relação autônoma com o Estado e a sociedade brasileira.
Porém, os povos indígenas não
alimentavam ilusões quanto às enormes dificuldades que teriam pela frente, para
fazer os direitos saírem do papel e se tornarem realidade. Não tinham dúvidas
de que as elites políticas, econômicas e militares de tudo fariam para
inviabilizar esses direitos. E assim aconteceu. Prova disto é que cinco anos
após a aprovação da Constituição, quando todas as terras indígenas deveriam
estar demarcadas, parlamentares e setores antiindígenas desencadearam uma
intensa campanha de “revisão” da Constituição. Na prática significa retirar
direitos sociais dos índios, quilombolas e outros setores sociais.
Se ainda não conseguiram retirar
os direitos indígenas da Constituição, conseguiram inviabilizar a efetivação
desses direitos, na prática. As maiores provas disso é que mais de 80% das
terras indígenas, ou sequer foram demarcadas ou tem alguma forma de invasão.
Além disso, o Estatuto dos Povos Indígenas, que seria fundamental para
implementar e explicitar a efetivação dos direitos, até hoje não foi aprovado.
O mesmo acontece com o Conselho Nacional de Política Indigenista, até hoje
emperrado no Congresso.
A guerra secular continua. Mudam
as garras, mas permanece o preconceito, o esbulho, ódio, o racismo, o etnocídio
e o genocídio. Até quando?
Os povos indígenas em Brasília e
em todo o país estão se mobilizando para defender seus direitos
constitucionais, consuetudinários, originários e sagrados, a seus territórios e
seus projetos de vida e autonomia.
Protagonismo indígena
Após as grandes assembleias
indígenas, da década de 1970, as grandes mobilizações da década de 1980, a
Marcha e Conferência Indígena de Coroa Vermelha, no ano 2000, os Acampamentos
Terra Livre, os povos indígenas no Brasil estão construindo um importante
protagonismo dentro do cenário de transformações sociais no país e no
continente. E hoje somam forças aos quilombolas, professores, acadêmicos
universitários e conta ainda com uma sociedade civil mais informada dos
direitos destes povos.
Estão se mobilizando para impedir
que se continue rasgando a Constituição, massacrando os povos originários,
tripudiando sobre a legislação nacional e internacional que asseguram os
direitos e a diversidade étnica, cultural e societária no Brasil.
Nesses 25 anos de Constituição, o movimento
indígena avançou e consolidou um amplo e permanente espaço de luta e afirmação
de seus projetos de vida e de futuro, construindo e ampliando as alianças com
os demais setores oprimidos, explorados e excluídos da sociedade. O movimento
indígena tem construído seu protagonismo na resistência e nas lutas pelos seus
direitos dentro dos amplos processos de transformações sociais e construção de
novos modelos de Estado e sociedade, na pluralidade de povos e culturas, com
justiça social e democracia participativa e comunitária.
Os povos indígenas estão em mobilização, na
Avenida Paulista, nas estradas, nas retomadas de seus territórios originários,
nos espaços dos três poderes em Brasília.
FONTE: CIMI
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