quinta-feira, 29 de maio de 2014

Francisco: “Estou pronto para discutir o primado petrino”

Papa Bergoglio exprime a vontade de discutir o primado petrino. “Entre as Igrejas permanecem as divisões mesmo após os abraços, os cristãos são perseguidos, existe o ecumenismo do sofrimento. Como a pedra do Sepulcro, devemos remover os obstáculos entre os cristãos”.
Francisco e Bartolomeu I se abraçaram no mesmo lugar onde, há 50 anos, aconteceu o abraço histórico entre Paulo VI e Atenagora I. Depois o almoço com os pobres no pensionato “Casanova”, papa Francisco encontrou na Delegação Apostólica de Jerusalém o patriarca ecumênico de Constantinopla.
A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada por Vatican Insider, 25-05-2014. A tradução é da IHU On-Line.
No importante encontro estiveram presentes também o secretário de Estado Pietro Parolin e o presidente do Pontifício Conselho para a promoção da Unidade dos Cristãos, cardeal Kurt Koch. Depois da troca de presentes e o momento do encontro privado, o Papa e o Patriarca ecumênico firmaram uma Declaração conjunta.
O que aconteceu hoje, afirmaram na declaração conjunta, “foi um novo, necessário passo do caminho para a unidade”. E se “o abraço entre o Papa Paulo VI e o Patriarca Atenagora depois de muitos séculos de silêncio prepara a estrada para um gesto de extraordinário valor, a remoção da memória e do meio da Igreja das sentenças de excomunhão recíproca de 1054”, o novo abraço serviu para “reiterar – explicam os dois chefes religiosos – o nosso compromisso de continuar a caminhar juntos para a unidade”.
“Anelamos – declaram conjuntamente o Papa e o Patriarca – o dia em que finalmente participaremos juntos do banquete eucarístico”. “Um objetivo para o qual orientamos as nossas esperanças, manifestaremos ante o mundo o amor de Deus e, de tal modo, seremos reconhecidos como verdadeiros discípulos de Jesus Cristo”.
No início, chegando ao Santo Sepulcro, vindos de duas portas diferentes da basílica, os dois chefes religiosos se abraçaram.
Os dois, conjuntamente, entraram na Basílica. Juntos veneraram a “Pedra da unção”, inclinando a cabeça e a beijaram.
“Desejo renovar o desejo já expresso por meus Predecessores, de manter um diálogo com todos os irmãos em Cristo para encontrar uma forma de exercício do ministério do Bispo de Roma que, em conformidade com a sua missão, se abra para uma situação nova e possa ser, no contexto atual, um serviço de amor e de comunhão, reconhecido por todos”, evidencia papa Bergoglio.
"Devemos crer que, como foi removida a pedra do sepulcro, assim possam ser removidos todos os obstáculos que ainda impedem a plena comunhão entre nós. Será uma graça da ressurreição, que já degustamos hoje', afirmaFrancisco.
"Quando cristãos de diferentes confissões sofrem juntos, uns ao lado dos outros, e quando se ajudam mutuamente com caridade fraterna, realiza-se um eccumenismo do sofrimento, se realiza o ecumenismo de sangue, que possui uma eficácia particular não somente para os contextos onde isto acontece, mas, em virtude da comunhão dos santos, também para toda a Igreja", acrescta Francisco.
E, de improviso, especifica: "Aqueles que matam os cristãos por causa do ódio à fé não se perguntam se se trata de católicos ou ortodoxos. Matam e derramam sangue cristão".
Voltando-se para o patriarca Bartolomeu, o Pontífice recomendou:
“Santidade, amado Irmão, caríssimos irmãos, coloquemos de lado as hesitações que trouxemos do passado e abramos o nosso coração à ação do Espírito Santo, o Espírito do Amor e da Verdade, para caminhar juntos para o abençoado dia da nossa plena comunhão”.
De fato, “não podemos negar as divisões que ainda existem entre nós, discípulos de Jesus: este lugar sagrado nos permite ver o drama do maior sofrimento”.
Para Francisco, portanto, “é preciso percorrer, agora, outra estrada para chegar àquela plena comunhão que possa exprimir-se também na participação da mesa eucarística, que ardentemente desejamos”. “Mas as divergências – encoraja o Papa – não devem nos assustar e paralisar os nosso caminho. Devemos crer que, como foi retirada a pedra do sepulcro, assim possam ser removidos todos os obstáculos que ainda impedem a plena comunhão entre nós”.
“Será – ao contrário – uma graça de ressurreição, que podemos já, hoje, degustar”. “Toda vez que pedimos perdão uns aos outros pelos pecados cometidos nos confrontos com outros cristãos, e cada vez que temos a coragem de conceder e de receber este perdão, nós – assegura – fazemos a experiência da ressurreição! Toda vez que, superados antigos juízos e julgamentos, temos a coragem de promover novas relações fraternas, nós confessamos que Cristo é verdadeiramente Ressuscitado! Cada vez que pensamos o futuro da Igreja a partir da sua vocação à unidade, brilha a luz da manhã de Páscoa!”.
E, de improviso, o Papa concluiu: “Quando a desunião nos torna pessimistas, pouco corajosos, devemos nos recordar que todos estamos sob o manto da Santa Mãe de Deus. Somente sob o seu manto encontraremos a paz. Que Ela nos ajude a prosseguir neste caminho”.
Concluídos os discursos, os dois chefes religiosos rezaram juntos, pela primeira vez em público, o Pai Nosso.
FONTE: IHU

domingo, 25 de maio de 2014

Papa Reza Diante do Muro da Separação entre Israel e Palestina

Belém (RV) - Na manhã deste domingo, logo após aterrissar no Estado da Palestina, Papa Francisco fez uma parada fora de programa e rezou diante do Muro da Separação entre Israel e Palestina. Diante das escritas “Palestina Livre” e “Precisamos de alguém que fale sobre justiça”, Papa Francisco observou a altura do Muro da Separação e, logo após, tocou-o e encostou a cabeça recolhendo-se em oração.

Israel começou a construir o Muro da Separação em 2002, chamando-o de Muro de Segurança e com o objetivo de impedir a entrada de terroristas no Estado de Israel. Na fronteira entre Jerusalém e Belém, justamente onde Papa Francisco passou, o muro chega a ter oito metros de altura. Os palestinos que têm permissão para cruzar a fronteira precisam, todos os dias, passar pelo “Check Point” – o mesmo acontece com turistas que precisam atravessar a fronteira para visitar a Basílica da Natividade, em Belém.

Uma imagem histórica que, por enquanto, torna-se o símbolo da passagem de Francisco pela Terra Santa. Todavia, Papa Francisco surpreendeu, mais uma vez, ao anunciar no final da celebração eucarística na Praça da Manjedoura, um convite para que os presidentes da Palestina e Israel, Mahmoud Abbas e Shimon Peres, respectivamente, encontrem-se com o pontífice no Vaticano para um “momento de profunda oração pela paz”.  (RB)

sexta-feira, 23 de maio de 2014

CNBB emite nota repudiando decisões do STF sobre mensalão

Em nota divulgada nesta quinta (22), a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), critica as decisões do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, contra o trabalho externo de condenados na Ação Penal 470, como José Dirceu, e afirma não ser lícito que atos políticos, administrativos e jurídicos levem a insuflar na sociedade o espírito de vingança e de “justiçamento”; "As decisões proferidas pela Presidência do Supremo Tribunal Federal sobre a execução da Ação Penal 470 (mensalão) que têm suscitado críticas e preocupações na sociedade civil em geral e na comunidade jurídica em particular exigem o inadiável debate acerca das situações precárias, desumanas e profundamente injustas do sistema prisional brasileiro.", afirma texto assinado por Pedro Gontijo, secretário executivo da comissão da CNBB
Nota da Comissão Brasileira Justiça e Paz sobre a execução da Ação Penal 470
 As decisões proferidas pela Presidência do Supremo Tribunal Federal sobre a execução da Ação Penal 470 (mensalão) que têm suscitado críticas e preocupações na sociedade civil em geral e na comunidade jurídica em particular, exigem o inadiável debate acerca das situações precárias, desumanas e profundamente injustas do sistema prisional brasileiro.
 A Pastoral Carcerária, em recente nota, referiu-se à Justiça Criminal como um “moinho de gastar gente” por causa de decisões judiciais que levam a “condenações sem provas” e “negam a letra da lei” com “interpretações jurídicas absurdas”. Inseriu, neste contexto, a situação dos presos da Ação Penal 470 ao denunciar o conjunto do sistema penitenciário, violento e perverso, que priva os apenados “dos cuidados de saúde e de higiene mais básicos” e carece de políticas públicas para sua inserção no mercado de trabalho.
A Comissão Brasileira Justiça e Paz, organismo vinculado à CNBB, soma-se à Pastoral Carcerária e “repudia” o conteúdo destas decisões, bem como a política de encarceramento em massa, que penaliza especialmente negros e pobres, com inúmeras práticas cruéis, estendidas aos familiares e amigos dos presos, como a “revista vexatória”, atentado direto à dignidade humana.
 A independência do Poder Judiciário somente realiza a necessária segurança jurídica em sua plenitude, quando viabiliza sem obstáculos o amplo direito de defesa e a completa isenção na análise objetiva das provas. Ela é imprescindível na relação do Judiciário com os meios de comunicação, não se podendo confundir transparência nos julgamentos com exposição e execração pública dos réus.
 A CBJP tem a firme convicção de que as instituições não podem ser dependentes de virtudes ou temperamentos individuais. Não é lícito que atos políticos, administrativos e jurídicos levem a insuflar na sociedade o espírito de vingança e de “justiçamento”. Os fatos aqui examinados revelam a urgência de um diálogo transparente sobre a necessária reforma do Judiciário e o saneamento de todo o sistema prisional brasileiro.
 Brasília, 22 de maio de 2014
Pedro Gontijo 
Secretário Executivo da Comissão Brasileira Justiça e Paz da CNBB
FONTE:CNBB

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Movimentos sociais cobram atenção dos poderes para violações de direitos por parte de mineradoras brasileiras



A audiência da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH-Senado) sobre o impacto da extração de minerais e poluição no Brasil culminou com a solicitação dos movimentos de maior atenção do Estado aos processos judiciais contrários as grandes mineradoras do país. O pedido partiu do representante do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), João Pedro Stédile. Representantes dos movimentos afirmam que exploração predatória de minérios causa graves violações contra os Direitos Humanos de comunidades tradicionais e moradores vizinhos de estradas de ferro e mineradoras, sem representar avanços sociais. O Projeto de Lei do Senado 508/2013, que criminaliza o vandalismo em manifestações, também foi alvo de críticas.

A audiência, presidida pela presidenta da CDH do Senado, senadora Ana Rita (PT-ES), teve início com a leitura de carta convocatória dos movimentos sociais, assinada pelo MST e movimentos nacionais como Via Campesina e outros, em repúdio ao PLS 508/2013, do senador Armando Monteiro (PTB-PE), que prevê aumento de penas para pessoas envolvidas em atos violentos durante manifestações. Segundo Ana Rita, é inaceitável que a criminalização dos movimentos ocorra dentro da Casa do Povo, com propostas que propõe penas para crimes contra o patrimônio na mesma medida que crimes contra a vida.
A audiência teve participação de cerca de 150 militantes do Comitê Nacional de Soberania Popular Frente à Mineração, que comemorou um ano em maio. MST, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) e Levante Popular da Juventude estiveram presentes ao ato, além da Mídia Ninja, que participou da cobertura. O representante do MST, João Pedro Stédile, foi enfático ao pedir que o Senado se atente para a forma como a empresa vem atuando no país, com relação às comunidades atingidas por seus empreendimentos, mas também à Justiça e aos demais poderes envolvidos.

Stédile denunciou ainda uma série de ações supostamente irregulares da empresa em casos de atropelamentos nas linhas de estrada de ferro comandadas pela Vale e ações ilegais na evasão de divisas para paraísos fiscais. “A Vale foi vendida de forma criminosa, e hoje não beneficia nenhuma das comunidades onde ela extrai minério, nem o povo brasileiro. Isso também guarda relação com a aprovação no governo FHC da Lei Kandir, que desonerou de impostos as exportações da Vale. Acabamos exportando sem ficar com imposto de nada”, afirmou. As violações ficaram mais compreenssíveis pela apresentação do documentário O Buraco do Rato, da diretora Kátia Visentainer, que denuncia violações da Vale S.A., lançado na audiência.

Vítimas da mineração
Para Pablo Neri, jovem do Movimento Nacional de Soberania Popular Frente à Mineração, as graves violações de direitos humanos sofridas pelo povo mais humilde nos municípios atingidos pela mineração predatória é cruel. “Os barões do minério estão lucrando sozinhos, enquanto nossos jovens são mortos nos municípios sem desenvolvimento algum. Das cinco cidades com maior índice de mortes de jovens no Pará, três são em municípios nas margens da estrada ferro Carajás. A miséria está lá nos matando, além da mineração em si”, afirmou o jovem. Ele ressaltou que o problema social com hospitais lotados com sistema de saúde precarizado e muitas doenças advindos do “mineral negócio” são de responsabilidade da empresa.

Ele é morador do Assentamento Palmares 2, no município de Parauapebas (PA), nas proximidades da maior mina a céu aberto do mundo. Segundo Pablo, a contaminação das águas do rio local por dejetos de minério, a exploração de trabalho dos adolescentes e crianças, e a não distribuição das riquezas geradas são motivos urgentes para que as atividades desse tipo de empreendimento sejam paradas. “Eles tem medo de nós. E a violência deles é sinal disso. Não ficaremos calados”, disse Neri, que tem apenas 19 anos e já sofre os males da perseguição.

Também estiveram presentes deputados como Dionilso Mateus Marcon (PT-RS) e o deputado  Padre João (PT-MG), que lamentou a não realização da Reforma Política no país e os riscos que a mineração irregular traz. “Avançamos, mas a soberania alimentar alcançada por mais de 40 milhões de brasileiros alcançadas ao longo dos últimos 11 anos de governo estão em risco, quando os próprios lençóis freáticos estão comprometidos, pela utilização de veneno, e isso não gera emprego, não garante desenvolvimento. Problemas econômicos, sociais e ambientais. E o que mais nos assusta é a falta da Reforma Política que permitiria o financiamento de campanha distanciando do risco de financiamento dessas grandes empresas”, afirmou o deputado Padre João.

O representante da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas gerais, deputado Durval Ângelo denunciou várias situações de trabalho escravo, inclusive envolvendo crianças e adolescentes nas cidades de Minas onde há mineração. “Até haitianos foram encontrados em situação de trabalho escravo em Conceição do Mato Dentro”, afirmou. Ele reiterou que muitos prefeitos são envolvidos pelo interesse econômico, mas depois acabam com graves prejuízos e consequências para os moradores de duas cidades.

Parlamento e interesses econômicos na mineração
Para o representante do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Carlos Bittencourt, os problemas desse gênero de envolvimento do capital minerador com os poderes públicos ficaram explícitos com as denúncias contra a Vale. “Foi a primeira vez que denunciamos um deputado que declarou publicamente seu financiamento direto por uma empresa ligada a mineração. E justamente o que relatava o código da mineração na Câmara”, citando caso do deputado Leonardo Quintão (PMDB-MG), que confirmou ser financiado pelas empresas interessadas, sendo relator do Novo Marco Regulatório da Mineração (PL 0037/2011).

Para Bittencourt, as práticas de espionagem, investigação e quebra de sigilo, invasão de escritório de entidades de terceiro setor e intervenção de empresa na alteração de investigações quanto à morte de pessoas nas linhas de trem são claros sinais de alto grau de violação de direitos humanos que precisam ser investigados.

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) ressaltou a importância da audiência da CDH Senado.
FONTE: JORNAL DO SENADO

terça-feira, 20 de maio de 2014

Com o selo da Reforma Agrária, assentamentos plantam e colhem de tudo pelo país


Por Vitor Nuzzi
Da Revista do Brasil

Seu Antônio carpina a terra. São 60 anos de experiência – aos 8, começou a ajudar os pais. Já foi meeiro, hoje é assentado. “Nunca trabalhei empregado em firma”, conta Antônio Paulino Santo, que trabalha na Agrovila III, uma área de assentamentos em Itapeva, no sudoeste paulista, a 270 quilômetros da capital e já perto da divisa com o Paraná. Sete agrovilas espalhadas na região reúnem 450 famílias, aproximadamente 1.800 pessoas, em 17.000 hectares. Em todo o país, há 54 cooperativas produzindo, segundo o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), que completa 30 anos neste 2014. A produção é diversificada, de itens in natura a beneficiados. Parte vem de cooperados, parte de produtores individuais.

O desafio é alcançar o mercado consumidor, já que os pequenos produtores enfrentam dificuldades de inserção no sistema de distribuição. “O ­primeiro princípio é primar pela soberania alimentar. Diversificar. O segundo é organizar as linhas de produção para agregar valor. São 150 mil famílias assentadas, todas produzem”, diz Antonio Miranda, do setor de produção nacional do MST.

Para o presidente da Cooperativa dos Assentados de Reforma Agrária e Pequenos Produtores da Região de Itapeva (Coapri), Sebastião Aranha, ele mesmo um ex-acampado, um sonho é colocar os produtos no mercado tradicional. “Ainda não tínhamos uma marca para negociar. Sempre se vendeu a granel. De uns anos para cá, começou a embalar. O feijão sai da roça, vem para o barracão e é embalado nos domínios da cooperativa.”

De lá sai o feijão Raízes da Terra – marca já destinada a merendas em muitas escolas públicas. “A cooperativa compra o feijão do assentado, embala e faz a distribuição via prefeituras”, conta Aranha. Na última safra, a cooperativa comercializou mais de 20 mil sacas de feijão, ou por volta de 1 milhão de quilos.

A agrovila onde trabalha seu Antônio abriga a Cooperativa de Produção Agropecuária Vó Aparecida (Copava), em ação há mais de duas décadas. Ali, trabalho, terra e renda são coletivos, e as moradias estão ao lado umas das outras. Ele mora a poucos metros de onde brotam produtos como alface, beterraba, cenoura, rúcula, cheiro-verde, berinjela, mandioca, pimentão, abóbora, jiló, quiabo. A cooperativa faz controle diário e mensal da produção, e o rateio é feito conforme as horas trabalhadas. Na última safra, dos 500 hectares agricultáveis saíram 307 toneladas de feijão, 810 toneladas de soja, 840 toneladas de milho e 1,1 mil toneladas de trigo, além de 110 mil litros de leite.

Integrante da administração da Copava, José Aparecido Ramos, o Zezinho, conta que a cooperativa tem 35 famílias, com 50 pessoas distribuídas em dez setores. Periodicamente, se reúne um conselho formado por um representante de cada setor. Ali também funcionam uma padaria (para consumo e encomendas) e um mercado, além de uma oficina para manutenção de máquinas. O mercado atende os cooperados e a vizinhança. O leite é distribuído aos sócios e também vendido. E de um alambique ao lado da padaria sai a cachaça da marca A Socialista.

Merenda

“A divisão de tarefas foi pela aptidão de cada um. Depois foi capacitando as pessoas”, diz a assentada Marisa de Fátima Almeida da Silva, que tem dois filhos, de 7 e 3 anos. Há um ano no local, Marisa já passou pela horta, pela cozinha, pelo resfriador de leite e pelo atendimento a visitas. Está novamente na horta. Planta, semeia, colhe, faz a irrigação, carpe, mantém o cultivo.

Parte significativa da produção é destinada ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). A Lei nº 11.947, de 2009, determina que pelo menos 30% dos recursos vindos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)­ para esse fim venham de produtos da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando assentamentos de reforma agrária, comunidades indígenas e quilombolas. O orçamento do Pnae para este ano é de R$ 3,5 bilhões.

Outra fonte é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), surgido em 2003, no início do governo Lula, por meio da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Segundo a Conab, pelo programa são adquiridos 511 produtos, com destaque para banana, raiz de mandioca, alface, laranja, abóbora e feijão. Os alimentos são destinados a hospitais, creches, escolas, asilos, restaurantes populares e cozinhas comunitárias.

Quando começou, o PAA chegou a ­41 mil­­ agricultores familiares, 65 projetos e R$ 81,5 milhões em recursos. Em 2012, chegou a 129 mil agricultores, com 2.600 projetos e R$ 585 milhões. No ano passado, caiu bruscamente, para os mesmos 41 mil agricultores de dez anos antes, 887 projetos e R$ 225 milhões. A Conab informa que isso se deve, principalmente, a duas questões. A primeira é o início do Plano de Fiscalização do PAA. A companhia diz que, antes, o plano era vistoriado por órgãos de controle do governo, enquanto à Conab cabia a supervisão. A partir de 2003, a Superintendência de Fiscalização passou a realizar inspeções periódicas e “de forma mais rigorosa que as supervisões”.

Além disso, o clima foi desfavorável à execução do PAA, principalmente na região Nordeste. A produção caiu e o número de projetos inscritos também. 

Mesmo assim, em março, último dado disponível, o PAA movimentou R$ 24,4 milhões, valor 44% acima de igual perío­do de 2012, até então o melhor resultado. “É o melhor início das operações do programa desde sua criação”, declarou a superintendente de Suporte à Agricultura Familiar da Conab, Kelma Cruz.

Crédito

Enquanto observa no galpão um lote com aproximadamente 250 sacas de feijão, em maquinário comprado de outra cooperativa, no Pontal do Paranapanema, e manuseado por três filhos de assentados, Aranha comenta que uma das grandes dificuldades para o pequeno produtor ainda é o crédito. “Às vezes anunciam milhões para a agricultura familiar, mas poucos têm acesso. Você pede um crédito, ele vem depois da safra. A liberação de recursos é muito difícil, muito devagar.” Outra questão a enfrentar é da formação. “Quem faz a assistência técnica são as lojas de veneno”, acrescenta Aranha, referindo-se aos fornecedores. “A formação nas universidades é voltada para as grandes áreas. Mas quem produz comida mesmo é o pequeno agricultor.”

Na Agrovila I, que completa 30 anos neste 13 de maio, estão assentadas 80 famílias, entre cooperados e produtores individuais. O feijão colhido nesta safra é levado para um barracão. Ali, até os anos 2000, eram organizadas as festas para comemorar o aniversário do assentamento, o primeiro da região, onde ficava, em uma área pública, a Fazenda Pirituba. De lá, o feijão será conduzido à central, empacotado e levado às prefeituras.

A poucos metros está a escola municipal Professora Terezinha de Moura Rodrigues Gomes, homenagem a uma docente da região que se aposentou justamente em 1984. Espalhadas, é possível observar áreas de cultivo de quintal. “Todo mundo já tinha uma hortinha. Mas o PAA incentivou bastante”, conta a técnica agrícola Fabiana Fagundes da Silva, no último ano do curso de Agronomia. Em um desses canteiros, o de dona Telma Alves, são cultivadas hortaliças e frutas. “Este ano, a partir de julho, vai entregar ponkan também.” No local onde antes aviões espalhavam agrotóxicos, hoje a produção de orgânicos começa a se tornar realidade, caso da área trabalhada por Telma e seus quatro filhos. “Ela já começou um processo de transição”, diz Fabiana. A maioria dos produtores de quintal é de orgânicos.

“Uma das grandes metas nossas é trazer a produção agroecológica para o assentamento”, diz Sebastião Aranha. “É um processo longo. A assistência técnica hoje é veneno. Estamos tentando rearticular o instituto de ensino, para pensar em um novo modelo.”

Incentivo

Miranda, do MST, que tinha 11 anos quando o pai ingressou em um acampamento no Paraná, defende a mudança de modelo. “Hoje estamos num processo de conversão. Falta investimento, falta política pública. Já temos várias experiências. No Rio Grande do Sul, começamos com cinco, hoje temos 1.500 famílias. No Paraná, queremos colocar o primeiro laticínio de leite orgânico. É um debate sobre o modelo de produção. O problema é a falta de incentivo”, afirma.
Ele estima que 30% da base, no setor produtivo, já produz de maneira agroecológica ou agro-orgânica. “Temos de dar o salto. O modelo atual de agronegócio está inviável. O impacto no ambiente e na saúde é grande. Precisamos discutir com a sociedade outro modelo de campo, respeitando a biodiversidade. Isso não vai ser feito só pelo MST, tem de envolver setores urbanos.”

Pertinho da horta de Telma, praticamente em outro quintal, Tino manuseia sementes em um viveiro, ajudado por Rita de Cássia dos Anjos. Alface, beterraba, salsinha. É semear e irrigar até quatro vezes por dia, para a muda crescer, ensina Ezequiel Rodrigues de Souza, olhando para 250 bandejas de mudas espalhadas no local. Com a proximidade do inverno, predominam culturas como repolho, brócolis, alface crespa e beterraba. No verão, alface lisa, berinjela, pimentão, pimenta. A família veio do Paraná. “Vim com 7 anos. Cresci no assentamento, ajudando o pai e a mãe”, conta Tino, hoje com 37 anos e perto de concluir a faculdade de Engenharia Florestal.

Mais alguns passos, atravessando a estradinha de terra, se encontra a Usina do Leite. O produto vem dos sete assentamentos organizados na região. Também irá para escolas, em parceria com a Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Itapeva.
Renda

Leite é o carro-chefe na produção do assentamento Valmir Mota de Oliveira, em Cascavel, oeste do Paraná, conta Amelindo Rosa, também do setor de produção do MST. O nome do assentamento homenageia Keno, assassinado em outubro de 2007. “É rara a família que não tem na sua renda a produção de leite”, diz. O Valmir Mota tem 83 famílias. Está perto da cidade, na BR-277, que liga a Curitiba. “Estamos perto do parque industrial, um lugar privilegiado.”

Em todo o estado, são 321 assentamentos, com 28 mil famílias. Da marca Campo Vivo saem produtos como arroz, requeijão, iogurte, queijo (minas, colonial, mussarela) e manteiga, vendidos em alguns supermercados. Há também o arroz Produtos da Terra e erva-mate, na região central. A parte da produção que conseguem industrializar é pequena ainda. “Quem produz e vende in natura não agrega tanto valor”, afirma Amelindo. “Estamos pensando nessa parte do beneficiamento. O maior desafio é como a gente organiza essa produção para escoar.”

A produção de orgânicos evolui. “Temos uma iniciativa até bonita aqui”, diz, citando quatro escolas de agroecologia no estado e a quarta edição da Jornada de Agroecologia, marcada para 21 a 24 de maio, em Maringá. “Há vários assentamentos que têm essa definição política.” O Valmir Mota é um deles. “Na seleção das famílias, quem veio para cá já foi com esse entendimento. Há, de fato, um amadurecimento sobre a necessidade de se produzir alimentos limpos. Nosso dilema é como organizar a produção para dar renda.”

No caso da Campo Vivo, ainda existe uma contradição, ele admite, à medida que há produtos não orgânicos indo para o mercado. O que exige investimentos na agroindústria e em linhas de comercialização. “Uma tarefa que não é fácil e não deve ser só nossa. Há um processo de conscientização da sociedade de procurar produtos orgânicos. Quando você domina o processo, diminui o custo de produção.”

Colheita premiada

Em Itaberá, vizinha a Itapeva, há 21 anos um grupo de mulheres começou a desenvolver a produção de fitoterápicos, à base de plantas medicinais. Em 2009, foi registrada a Cooperativa de Produtores de Plantas Medicinais da Agricultura Familiar (Cooplantas), com 32 mulheres e dois homens. Em 2013, a Cooplantas foi finalista do prêmio “Mulheres Rurais que produzem o Brasil Sustentável”, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. No local se desenvolve um projeto de reflorestamento, por meio do plantio dessas espécies, em conjunto com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Parte da produção se destina à rede pública, por meio do Sistema Única de Saúde (SUS).

“Essa é uma cultura de nossos avós”, diz a cooperada Nazaré Carvalho, há mais de 20 anos ajudando a organizar a produção. Creme de calêndula, própolis, arnica, pomada de barbatimão, de aroeira ou a chamada ‘milagrosa’. – “O nosso carro-chefe” –, tintura de carqueja, sabonete de mel e própolis, ervas secas... “Tudo é de nossas hortas”, ressalta a alagoana que se orgulha de um enorme mandacaru diante de sua casa. Os produtos são vendidos em feiras livres e universidades. “Tem gente que vem comprar aqui.”

Nordeste persistente

No município de Simão Dias, agreste sergipano, a 100 quilômetros de Aracaju, o assentamento 8 de Outubro – originário de uma ocupação feita em 1997 – ostenta a condição de maior produtor de abóbora da região Nordeste e principal produtor de grãos do estado. Na safra passada, saíram de lá 15 caminhões de 15 toneladas cada, referência usada pelos agricultores para mensurar a produção de abóbora. Outro produto de destaque, o milho, somou mais de 100 mil sacas (de 60 quilos cada). “Não só furamos o bloqueio da comercialização, como viramos referência na região”, diz o assentado Esmeraldo Leal. Ele conta que a “abóbora dos sem-terra” virou uma espécie de selo. “Falar a procedência já era garantia de qualidade.”

Isso estimulou a economia local, acrescenta. Para Esmeraldo, pode-se falar em uma marca antes e depois da entrada dos trabalhadores rurais. “Quem tinha terra abandonada passou a produzir por medo, de ser classificado de improdutivo”, conta. Ele lembra que Simão Dias foi um grande produtor de algodão até meados do século passado, até uma praga, chamada do bicudo (um inseto), dizimar a cultura.

A abóbora in natura segue principalmente para Recife, onde será vendida no Ceasa. O milho vai para casas de farinha de milho e granjas em Pernambuco e na Paraíba. Atualmente a produção de abóbora refluiu por causa de pragas, mas a expectativa é de que volte a crescer. Neste momento, o milho “está dando mais preço” no mercado.

Essa realidade, entretanto, não é uma regra na região. “Em Alagoas, a produção primária que ainda predomina segue desacompanhada de políticas estruturantes, como a agroindústria”, comenta Débora Nunes, do setor de produção do MST. E com suas peculiaridades. A macaxeira, por exemplo, item de destaque, precisa ser vendida no mesmo dia na feira. Assim como o inhame, a batata-doce, o feijão de corda, outros produtos tradicionais. Tem crescido a produção de abacaxi, laranja, maracujá, abóbora, mas Débora ressalta dificuldades de acesso aos programas públicos (PAA e Pnae). “Temos forçado as prefeituras. Mas o grande canal nosso de comercialização são as feiras, onde há fidelização entre nós, que produzimos, e o consumidor”, conta, valorizando a realização, há 14 anos, de uma feira estadual em todo mês de setembro.

Ela, que atua na zona da mata, vê a comercialização também como um dos entraves para o crescimento do negócio entre os pequenos produtores, mas alerta que a falta de compreensão do consumidor também é parte do problema. “A sociedade precisa definir o que quer comer, comida envenenada ou comida saudável.”

Em todo o estado, são 70 assentamentos e 3 mil famílias, predominantemente na zona da mata, e 560 estão no sertão. Entre elas a do assentado Cleilson Moreira da Silva, o Marquinhos. “Ainda falta incentivo do governo federal, estadual e dos municipais”, reitera Marquinhos, instalado no assentamento Maria Bonita, em Delmiro Gouveia (a 300 quilômetros de Maceió), onde 78 famílias cultivam palma (para alimentação de animais), milho, feijão, abóbora, melancia. Ele lamenta que os produtores ainda permaneçam excluídos de políticas públicas. “A gente fica de fora porque é uma burocracia danada para chegar até nós. Os gestores dificultam.”

Sua região vê com boas perspectivas o projeto Plantando Caju, Colhendo Desenvolvimento, com apoio da Petrobras. “Vai dar um salto de qualidade. A gente percebe as famílias com ansiedade.” Hoje, a produção é ainda praticamente toda vendida aos chamados atravessadores, além das feiras livres, de oito em oito dias. Marquinhos – que ficou com esse “apelido” em lembrança de um amigo que morreu – destaca ainda as chamadas feiras da reforma agrária, realizadas periodicamente.

No projeto do caju, a ideia é desenvolver as mudas em um viveiro (de 600 metros quadrados), no próprio assentamento, e organizar uma agroindústria para vender doces e outros produtos. No final de abril, 18 pessoas passavam por um processo de capacitação sob responsabilidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “A região tem potencial para fruticultura, verduras. Precisa de apoio.” Aos 34 anos, Marquinhos nunca deixou o sertão e, com a metade da idade, lembra seu Antônio, lá de Itapeva. “Desde criança eu trabalho na terra. Não sei fazer outra coisa.”
FONTE: MST

domingo, 18 de maio de 2014

Fiscalização volta a flagrar escravidão em megaobra da Anglo American em Minas Gerias

Construção de mina em Conceição do Mato Dentro (MG), onde 185 trabalhadores foram flagrados em condições análogas às de escravos (Foto: Reprodução/Anglo American)
Por Stefano Wrobleski / Repórter Brasil
Mais uma vez, operação de fiscalização flagrou trabalho escravo na construção do Sistema Minas-Rio, megaobra para a abertura do que tem sido apresentado como maior mineroduto do mundo. Ao todo, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), 185 trabalhadores foram submetidos a condições análogas às de escravos, sendo que 67 prestavam serviços para a multinacional Anglo American e os demais para outras três empresas. Participaram da inspeção que resultou no flagrante a Polícia Federal, Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Trabalho (MPT). É o segundo caso de escravidão envolvendo a Anglo American, que em novembro de 2013 foi considerada responsável pela escravidão de 172 trabalhadores, incluindo 100 haitianos. Em nota, a empresa afirmou que “repudia qualquer acusação de trabalho escravo”, assim como fez no flagrante anterior.

Os 67 trabalhadores escravizados pelos quais a Anglo American foi responsabilizada tinham contrato de trabalho formalizado com a Tetra Tech, intermediária contratada pela multinacional. A terceirização foi considerada ilegal após a fiscalização verificar que era a Anglo American que coordenava e dirigia as atividades dos funcionários da Tetra Tech e que as duas empresas tinham a mesma atividade-fim, que é a extração de minério de ferro. “É como se a Tetra Tech fosse uma sombra da Anglo American”, definiu Marcelo Campos, auditor fiscal e coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Análogo ao de Escravo da Superintendência do Trabalho e Emprego de Minas Gerais. A relação levou os 67 a serem enquadrados como empregados da Anglo American pelo MTE. A decisão se baseou na súmula nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que prevê que no caso de contratação ilegal de empresa interposta a responsabilidade jurídica é da empresa contratante.
peçaA escravidão foi caracterizada em função de uma série de violações, incluindo a submissão dos operários, motoristas e técnicos que trabalhavam na obra a jornadas exaustivas sistemáticas. De acordo com a fiscalização, os funcionários eram forçados a trabalhar sem parar por períodos muito além dos limites previstos na legislação brasileira.Os auditores afirmam que alguns dos motoristas chegaram a trabalhar 18 horas por dia. Há casos de trabalhadores que tiveram registrada a realização de 200 horas extras em um só mês. Além das horas extras, o horário de almoço também não era respeitado: em vez de uma hora, as vítimas tinham direito a somente 20 minutos de pausa para comer.
A situação é grave considerando que a maior parte das vítimas trabalhava como motorista no deslocamento contínuo de empregados entre Conceição do Mato Dentro (MG), cidade onde estão alojados, e o canteiro de obras, a cerca de 30 quilômetros. A legislação brasileira prevê que, além das 44 horas semanais de trabalho, divididas em 8 horas diárias, são permitidas somente duas horas extras excedentes.
Anglo American pode ser incluída na “lista suja” da escravidão
Como desta vez foi considerada responsável direta pela escravidão de 67 trabalhadores, a Anglo American pode, junto com as outras empresas flagradas, entrar na “lista suja” do trabalho escravo. Mantida pelo MTE e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, a relação serve como base para bancos definirem restrições de financiamentos e para as empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que se comprometem a não negociar com quem explora escravos.
Em julho de 2013, a Anglo American chegou a solicitar ao MTE a flexibilização da jornada de trabalho de seus empregados e os de suas terceirizadas, pedindo a permissão para que pudesse manter trabalhadores em jornadas de 58 horas semanais por cinco meses. O pedido foi negado pelo órgão, que respondeu que os motivos apresentados pela companhia, de cunho econômico, não tinham sustentação legal.
Na nota em que nega o uso de escravos em sua obra, a Anglo American alega que “um grupo muito pequeno tem uma jornada de trabalho que, segundo os fiscais, ultrapassa o limite diário permitido por lei”. Com a negativa do MTE em flexibilizar a jornada de trabalho, a mineradora disse ter firmado “acordo com o sindicato, autorizando a flexibilização da jornada, com o aval do Ministério do Trabalho”. A fiscalização do MTE, no entanto, nega que tenha havido aval do órgão: “Pelas datas dos documentos, entendemos que esses acordos coletivos foram fraudados”, declarou o auditor Marcelo Campos, responsável pela ação.
Procurada pela reportagem, a Tetra Tech não se posicionou.
Construção do Sistema Minas-Rio (Foto: Reprodução/Construtora Modelo)
Construção do Sistema Minas-Rio. Foto: Reprodução/Construtora Modelo
Sorteio de carros para compensar jornadas Das 185 vítimas, 46 trabalhavam para a Milplan e 53 para a Enesa, que faziam construção pesada nas minas. Marcelo declarou que as duas empresas desenvolveram um sistema de sorteio de prêmios que incentivava a adesão de quem aderisse às jornadas exaustivas. “As premiações iam desde caixas de bombom até carros”, disse.
jornadasEm nota, a Milplan disse que “nunca houve qualquer coação para a realização de horas extras, que estas sempre foram realizadas voluntariamente e em obediência às normas que regem as relações de trabalho”. Já a Enesa não enviou posicionamento até a publicação desta matéria.
Outras 19 vítimas eram da Construtora Modelo, que levanta casas para os futuros funcionários da extração de minério de ferro, quando as obras estiverem prontas. A empresa nega ter submetido seus trabalhadores a condições análogas às de escravos e informou que “os empregados ouvidos são enfáticos ao afirmar que praticam horas extras para obter um acréscimo salarial”.
Além das irregularidades quanto à jornada e à terceirização, nenhuma das empresas flagradas pagavam pelo tempo despendido pelos empregados até o local de trabalho, um direitogarantido em lei quando a área não é servida por transporte público.
A reportagem entrou em contato com as procuradoras Águeda Aparecida Silva Souto, do MPF, e Elaine Nassif, do MPT, que acompanharam a fiscalização. Ambas, no entanto, preferiram aguardar a conclusão do relatório de fiscalização do MTE antes de se posicionarem publicamente sobre o caso. O documento, com depoimentos dos empregados, imagens das condições encontradas e informações detalhadas sobre as jornadas, pode embasar ações judiciais contra as empresa nas esferas trabalhista e penal da Justiça.
Clique no mapa para ver a região do sistema Minas-Rio, que deve construir mineroduto com 525 quilômetros de extensão, entre Conceição do Mato Dentro (MG) e São João da Barra (RJ) (Imagem: reprodução OpenStreetMap.org)
Clique no mapa para ver a região onde será construído o mineroduto, entre Conceição do Mato Dentro (MG) e São João da Barra (RJ) (Imagem: OpenStreetMap.org)
Mineroduto terá 525 km de extensão 
De acordo com o site da Anglo American, o Sistema Minas-Rio terá o maior mineroduto do mundo. Com 525 quilômetros de extensão, ligará o município mineiro de Conceição do Mato Dentro ao Porto de Açu, em São João da Barra (RJ).
Ainda segundo a empresa, a produção inicial de minério de ferro será de 26,5 milhões de toneladas por ano, o que equivale a 6,8% da produção brasileira de 2011, que foi de 390 milhões toneladasde acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).
A Anglo American é uma das maiores mineradoras do planeta, e teve, segundo informações da empresa, lucro operacional de 6,6 bilhões de dólares em 2013, o que equivale a R$ 14,6 bilhões.
FONTE: REPÓRTER BRASIL

domingo, 11 de maio de 2014

A IGREJA E A QUESTÃO AGRÁRIA BRASILEIRA NO INÍCIO DO SÉC XXI

O plenário da 52ª Assembleia Geral da CNBB aprovou na tarde desta quarta-feira, 7 de maio, o Documento sobre a visão da Igreja em relação à Questão Agrária Brasileira no século XXI. O processo de construção começou há 5 anos. Desde o ano passado foi publicado como um texto de estudo da CNBB e recebeu contribuições de diversos bispos e dioceses.
 O Documento aprovado está dividido em três partes. Na primeira, faz uma contextualização da situação agrária atual. “Nessa parte, os bispos mostram quais são os gritos ensurdecedores que brotam de tantas realidades, como os povos indígenas, os quilombolas, os pescadores, os ribeirinhos, os extrativistas”, explica o presidente da Comissão Pastoral da Terra, dom Enemésio Lazarris.
A segunda parte traz o olhar dos bispos sobre a atual questão agrária, abordando a posse e o uso da terra à luz da Sagrada Escritura e dos Documentos da Igreja. Já na terceira parte, surgem os compromissos pastorais diante da questão. Dom Enemésio destaca que o Documento “é a palavra de mais de 350 bispos hoje para a sociedade em geral sobre este tema importante”. Segundo ele, “não se destina apenas para dentro da comunidade eclesial, mas para toda a sociedade”.
A parte final do Documento apresenta os desafios diante de realidades bem concretas: trabalho escravo, defesa da natureza, cuidado com a água, produção de energia sustentável. O episcopado também cobra do poder público uma posição sobre esta realidade. “Acreditamos que esse documento seja apresentado aos candidatos aos governos estaduais e federal, dizendo qual é a posição da Igreja em relação à questão agrária, e sobretudo sobre a função social da terra e da propriedade”, disse o bispo.
Leia o documento na integra: 
FONTE: CNNB

quarta-feira, 7 de maio de 2014

Relator do Marco Regulatório da Mineração é acusado de quebra de decoro

Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração alega que Leonardo Quintão (PMDB-MG) teve parte de sua campanha financiada por mineradoras
Entidades e organizações não governamentais que fazem parte do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, entre elas a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o Instituto Socioambiental (ISA) e o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), querem a abertura de um processo contra o deputado federal Leonardo Quintão (PMDB-MG) por quebra de decoro parlamentar. O argumento é que o deputado não poderia ser o relator do Marco Regulatório da Mineração na comissão especial da Câmara, pois teve parte de sua campanha financiada por mineradoras. Segundo o Código de Ética e Decoro Parlamentar, é quebra de decoro relatar matéria de interesse específico de pessoas físicas ou jurídicas que tenham contribuído para a campanha eleitoral do político. Em 2010, o parlamentar recebeu R$ 379, 7 mil de cinco mineradoras, valor correspondente a 20% de todos os recursos usados por ele para se reeleger deputado.
Essa proibição consta do Código de Ética desde 2001, mas é a primeira vez que é feita uma representação popular por quebra de decoro contra um parlamentar pelo fato de ele relatar um projeto de interesse direto de seus financiadores de campanha. O pedido foi protocolado ontem na Mesa Diretora da Câmara, mas sua tramitação tem vários passos e não há garantia de que ele será aceito. Primeiro, tem de ser avaliado pela Mesa, que decide se o caso terá sequência ou não. Se for aceito, é encaminhado à corregedoria para emissão de parecer, que tem de ser analisado pela Mesa Diretora antes de seguir para a Comissão de Ética.
O advogado do ISA Raul Silva Telles do Valle afirma que até hoje nenhuma representação popular por quebra de decoro vingou na Câmara, mas garante que as entidades vão fazer pressão para que o destino desta seja diferente. “Não estamos fazendo nada de brincadeira. O texto do Código de Ética é muito claro a esse respeito, só que durante anos todos se acostumaram com essa prática, e nunca houve cobrança para impedi-la”, afirma. A iniciativa, segundo Raul, classificada por ele de ato de rebeldia, tem também a intenção de chamar a atenção para a proposta, já aprovada pelo Senado e em tramitação na Câmara, que proíbe doações de empresas para campanhas eleitorais. “O relator não pode ter lado, por isso queremos que ele seja afastado do cargo.” Uma das entidades que assinam a representação é a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma Política.
Sem Consenso
O deputado apresentou uma primeira versão do relatório que não agradou ao governo federal, autor do projeto inicial de reformulação do atual Marco da Mineração, editado em 1967, nem às entidades ambientais e de defesa dos atingidos pela atividade. Ele então fez uma nova versão preliminar, sobre a qual também não há consenso. Tanto que o texto está parado na Comissão Especial criada na Câmara para discutir o assunto.
Entre os pontos criticados do relatório está, segundo a assessora política do Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Alessandra Cardoso, da entidade que integra o comitê, a não inclusão no texto de nenhum tipo de salvaguarda de direitos das populações afetadas pela exploração de minério. Ela também cita a flexibilização das regras para a concessão do registro de exploração mineral. Procurado pela reportagem, Quintão não se manifestou sobre o caso.
O que diz o Código
Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados
Art. 5º – Atentam, ainda, contra o decoro parlamentar as seguintes condutas, puníveis na forma deste Código:
VIII – Relatar matéria submetida à apreciação da Câmara dos Deputados, de interesse específico de pessoa física ou jurídica que tenha contribuído para o financiamento de sua campanha eleitoral;
FONTE: DIÁRIO DE PERNAMBUCO 

domingo, 4 de maio de 2014

Dom Tomás Balduino - Amor encarnado em gestos e doação



Tomás Balduino em nossas lutas conosco
Pastor do povo
Profeta dos sem terra
Igreja solidária e presente
Igreja Povo que caminha
Índio, quilombola, camponês, sem terra
Libertação
Ressurreição dos pequenos e oprimidos
Fé viva
Esperança ativa
Amor encarnado em gestos e doação
Tomás Balduíno
Sempre vivo na fé e na luta do Povo
Homem do Cerrado e de vida em mutirão
Pastor, profeta e irmão

Frei Rodrigo de Castro Amédée Péret, ofm
Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade



Fotos (CPT - Triângulo Mineiro): 6 meses de vigília, dos movimentos de luta pela terra, em frente a Monsanto em Uberlândia (MG) - Campanha contra os transgênicos, ano de 2003