domingo, 21 de abril de 2019

Cristo Ressuscitado: Uma flor nasceu na rua!

Cristo Ressuscitou! O mundo com seus desafios parece o mesmo, com seus abismos e injustiças. Contudo, creio, que a vida brota. Compartilho, com vocês, inspirado em Dom Helder Camara, um trecho do poema abaixo, de Carlos Drumond de Andrande. Eu os convido a contemplar a beleza e a força dessa flor, que a cada dia brota e ressuscita na vida dos excluídos. 





Uma flor nasceu na rua!


Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.


Sua cor não se percebe.


Suas pétalas não se abrem.
Seu nome não está nos livros.
É feia. Mas é realmente uma flor.


Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde


e lentamente passo a mão nessa forma insegura.
Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.
Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio. 
(Carlos Drumond de Andrade - A Flor e a Nausea)


Repito então com Dom Helder Camara: 
"Mais que comum dos dias, olhei o mais que pude os rostos dos pobres, gastos pela fome, esmagados pelas humilhações, e neles descobri teu rosto, Cristo Ressuscitado!"
Feliz Páscoa
Frei Rodrigo Péret

sexta-feira, 19 de abril de 2019

Contemplar a Cruz e os Crucificados

 Reflexão Bíblica de Adroaldo Palaoro sacerdote jesuíta, comentando o evangelho da Sexta-feira Santa (Jo, 19, 16-30)
"O Crucificado é a expressão máxima da ternura entregue até o extremo na missão de aliviar o sofrimento dos últimos. Por isso, a ternura é também subversiva, porque inverte a ordem “colocando como primeiros os últimos” (Mt 20,16). A ternura vivida até o extremo, à maneira de Jesus, tem repercussões sociais e políticas e por isso se faz insuportável para aqueles que “fazem de sua força a norma da justiça” (Sb 2,1-17) e “reprimem a verdade com a injustiça” (Rom 1,18).
Jesus é condenado porque sua atuação e sua mensagem sacodem na raiz o sistema organizado a serviço dos poderosos do império romano e da religião do templo. A vida de Jesus se havia convertido em um estorvo que era necessário eliminar, como as vidas de tantas pessoas que hoje se tornam molestas ao sistema ou que são consideradas “presenças perigosas”. Este é o mistério que hoje estamos contemplando."

Leia na integra a reflexão reflexão Bíblica de Adroaldo Palaoro:

Na história do cristianismo tivemos sempre duas grandes tentações: eliminar a cruz ou exaltá-la. A cruz não tem a última palavra no Evangelho, mas é uma página incômoda que não podemos saltar, como tampouco podemos negar nem ocultar a densidade do sofrimento. Negá-lo é negar o humano.
Há algo muito perturbador na ideia de um “Deus crucificado”. Escândalo para uns, contradição para outros, absurdo para muitos.... Onde fica a grandeza, a força, o poder? Que sentido tem ainda hoje em dia ajoelhar-se ou fazer reverência diante do crucificado? Como olhar a face da derrota? Como aceitar a morte do Justo? Como compreender o silêncio do Pai diante da morte do Filho?
E aí surge a eterna pergunta pela questão do mal, pelo sofrimento dos inocentes, pela tragédia que atravessa a criação. Como é possível? E um grito se eleva ao céu, entre a queixa e a incompreensão: “por que? ”
Deus crucificado é, junto à ressurreição, a intuição mais radical de nossa fé. Fala-nos da fragilidade humana, assumida pelo mesmo Deus; fala-nos da paz como único caminho, frente a outras sendas construídas sobre o rancor, a violência ou a lei implacável; fala-nos do amor como a maior transgressão em um mundo que etiqueta muitas pessoas como indignas de serem amadas; fala-nos da dor de Deus, um Deus que não é distante, alheio nem indiferente à criação que saiu de seu coração; um Deus próximo até o ponto de esvaziar-se em nós, conosco, por nós; fala-nos das entranhas de misericórdia d’Aquele que se comove diante dos sofrimentos humanos; fala-nos de compromisso, de uma aliança inquebrantável, e de risco; fala-nos de vítimas inocentes e verdugos inconsciente que não sabem o que fazem.
Mas, nem para verdugos nem para as vítimas a Cruz há de ter a palavra definitiva. Tudo isso, e muito mais, é o que podemos ver quando contemplamos o Crucificado

Gólgota, o monte da Cruz, do Amor e do pranto. Um lugar carregado de densidade. Nele está o amor fiel e atravessado de uma mãe, a fidelidade de um discípulo e a coragem das mulheres que não abandonam nem fogem; ali se expressa a esperança ferida de um bom ladrão, o reconhecimento assombrado de um centurião, a zombaria daqueles que não são capazes de compreender e pedem provas, a indiferença daqueles que repartem as roupas do crucificado; e, sobretudo, Gólgota desvela uma morte que é consequência de uma vida de entrega, feita de gestos, palavras e obras; desvela uma vida que se fez doação radical nas mãos daquele que se revela Misericórdia.
A vida de Jesus é inseparável de sua execução, de sua morte. Estas são consequência de seu modo de ser e de estar na vida e com as pessoas, sendo misericórdia em ação, misericórdia em relação.
Crucificado é a expressão máxima da ternura entregue até o extremo na missão de aliviar o sofrimento dos últimos. Por isso, a ternura é também subversiva, porque inverte a ordem “colocando como primeiros os últimos” (Mt 20,16). A ternura vivida até o extremo, à maneira de Jesus, tem repercussões sociais e políticas e por isso se faz insuportável para aqueles que “fazem de sua força a norma da justiça” (Sb 2,1-17) e “reprimem a verdade com a injustiça” (Rom 1,18).
Jesus é condenado porque sua atuação e sua mensagem sacodem na raiz o sistema organizado a serviço dos poderosos do império romano e da religião do templo. A vida de Jesus se havia convertido em um estorvo que era necessário eliminar, como as vidas de tantas pessoas que hoje se tornam molestas ao sistema ou que são consideradas “presenças perigosas”. Este é o mistério que hoje estamos contemplando.
A liturgia da Sexta-feira Santa nos ajuda a abrir os olhos diante dos crucificados de hoje e a impotente proximidade de Deus com eles.
É preciso olhar sempre a Cruz por dois lados: o dos crucificadores e o das vítimas. Do lado dos crucificadores, a cruz é morte. “Maldita seja a cruz”. Nós cristãos já temos nos acostumado a cantar “Ó Cruz, tu nos salvarás”, e esquecemos que há cruzes que não são cristãs, mas legitimadoras da dor e da injustiça que recai sobre as vidas as pessoas mais feridas e excluídas. A Cruz nunca vai nos poupar da dor, mas nos dá lucidez. Ela nos impede cair em espiritualidades evasivas, depura nossas imagens de Deus, às vezes demasiado burguesas e light, que não suportam a prova do fracasso, da obscuridade e do silêncio.
A violência e a injustiça geram vítimas e contam com nossas cumplicidades. A Boa Notícia do evangelho se manifesta a partir do reverso da história e assume a miséria, a debilidade humana, o limite físico e psíquico, o fracasso. Por isso, a sexta-feira santa nos revela também os aspectos mais obscuros de nossa condição humana.
Há lugares e situações de vida diante dos quais não podemos deixar de exclamar: “Sempre é Sexta-feira Santa!”: miséria, exaltação da violência, relações centradas na intolerância, solidão, sonhos quebrados...
Aproximar-nos de cada um desses lugares é tocar as chagas do Crucificado, chagas que criamos e geramos com nossa indiferença e nossa omissão; chagas que nos molestam porque cheiram mal, porque gritam e nos desmascaram, devolvendo-nos à nossa verdade mais íntima.
Adentrar-nos em suas vidas é também apalpar o mistério, o mistério do mal e da injustiça, o mistério de uma Vida com maiúsculas que sempre é mais e que brota a partir de baixo e a partir de dentro para dar à luz a esperança, embora nós, muitas vezes, não saibamos percebê-la.
No Crucificado, Deus nos mostra a densidade mais profunda de seu mistério. Um Deus que não só está a favor das vítimas, mas que, à mercê de seus verdugos, revela sua máxima solidariedade e proximidade para com “os sem poder”, com aqueles que “desfigurados, nem pareciam homens” (Is. 52,14).
Quando acompanhamos Jesus na paixão, também “vamos sendo talhados” pelas cenas que contemplamos, com o coração aberto à dor e à aflição. Essa dor esvazia nossas autossuficiências e purifica nossas auto-imagens triunfais, humanizando-nos. Ao contemplar o amor redentor de Deus revelado em seu Filho Jesus, nós nos perguntamos onde está Ele no sofrimento. Há aqui uma inversão de perguntas:
Para responder à interrogação: “Onde está Deus nas situações de sofrimento e morte? ”, Deus nos desafia a responder à sua própria questão: “Onde está você no meu sofrimento? ”.
Contemplando o Crucificado vamos pedir ao Senhor neste dia que nos ajude a permanecer solidários nas situações onde a “Divindade se esconde” (S. Inácio), que nos ajude a olhar a Cruz e escutar o grito dos crucificados nela; escutar os gritos daqueles que vivem na noite do sofrimento, da violência, da injustiça e do desamor. A Cruz é um grito no qual cabem todos os gritos da humanidade, desde o primeiro choro de uma criança até o último suspiro de um moribundo.
Escutemos neste dia os gritos daqueles que vivem na noite do sofrimento, os gritos dos empobrecidos, o grito dos povos e culturas condenadas à exclusão...; todos esses gritos unidos ao grito da mãe-terra, destruída em seus ecossistemas e explorada pela ganância.
Escutemos o grito das vítimas do bilionário negócio da venda das armas; o grito dos “descartados” e de todos aqueles que o sistema considera como sobrantes: os sem teto, sem terra, sem trabalho; o grito daqueles que são julgados por leis injustas em tribunais que, como Pilatos, lavam as mãos....

Para meditar na oração 

Nos Gólgotas deste mundo, continuar apostando, gritando e proclamando Vida, apesar daqueles que investem na cultura da morte.
FONTE: IHU

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Quinta-feira Santa. Ceia do Senhor - Eucaristia - Diga-me como ser pão


“Nossos olhos precisam abrir-se. Devemos encontrar logo o meio não apenas de distribuir o pão, mas de multiplicá-lo. O Cristo nos diz, nestes dias, que não basta distribui-lo aos que não o têm, pois o importante é ajudar na construção de um mundo mais justo, onde não haja mais um pequeno número dos que possuem muito ao lado das multidões incalculáveis dos que nada possuem.” Dom Helder Camara



"Não podemos pedir ao Pai “o pão nosso de cada dia” sem pensar naqueles que têm dificuldades para obtê-lo. Não podemos comungar com Jesus sem nos fazermos mais generosos e solidários. Não podemos nos dar a paz uns aos outros sem estar dispostos a estender uma mão a quem está mais só e indefenso ante a crise." Antonio Pagola 

Seguir Jesus: ser para irmãos e irmãs, independente de etnia, classe, credo, genero... Como ELE, Ser pão que alimenta a vida, a justiça, a natureza...

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Arquidiocese de BH contesta informe publicitário sobre mineração na Serra da Piedade

A Arquidiocese de Belo Horizonte esclarece que o informe publicitário divulgado na edição número 116 da Revista Ecológico, de março de 2019, com texto claramente redigido a partir da visão parcial da empresa que pretende explorar a Serra da Piedade, cria equivocado entendimento da realidade. Ao final do texto, o leitor é induzido a acreditar que há concordância por parte da Arquidiocese de Belo Horizonte a respeito do objetivo da empresa. Ao contrário, a Arquidiocese de Belo Horizonte reitera veementemente que não quer mineração na Serra da Piedade.
Entre as graves imprecisões, na página 42, o texto diz que a empresa “acatou pedidos da Arquidiocese”. Isto é uma inverdade: a Justiça determinou, a pedido da Arquidiocese de Belo Horizonte, que não haja tráfego de caminhões transportando minérios nas vias de acesso ao Santuário em dias de peregrinação dos fiéis. Sublinhe-se, pois, este fato: o que se conseguiu, até aqui, no que se refere à proteção dos peregrinos e do seu patrimônio sagrado foi determinação judicial e não acordo com a empresa.
Mais uma vez a Arquidiocese de Belo Horizonte é citada na página 43. A publicidade diz que a mineradora realizou diversas reuniões com a Arquidiocese, comunidades e instâncias do poder público, dando a entender que houve diálogo e entendimento. É inverdade. O impasse continua: a Arquidiocese de Belo Horizonte não concorda com a exploração de minério na Serra da Piedade, já tão degradada.
A empresa, ao adquirir a Mina, assumiu a responsabilidade de recuperá-la, dedicando-se exclusivamente à área devastada. Se assim o fizesse, já conseguiria obter ganhos financeiros, pois a área explorada ainda guarda preciosas riquezas minerais. Mas, no objetivo de ampliar ganhos com o empreendimento, a empresa quer devastar áreas ainda totalmente preservadas.
Chama a atenção e causa perplexidade o que é dito na página 44: “Ao final do novo modelo de exploração mineral, não apenas o Morro do Brumado, mas toda a Serra da Piedade, tombada ou não, terá sua geografia de volta e melhorada.” Ora, por mais que se invista na recuperação da área, jamais será possível tornar o território devastado igual ou melhor do que era, em sua configuração original. Afinal, perdeu-se o equilíbrio, a harmonia entre a fauna e a flora, as nascentes e cavernas, o bioma único, que só ali existia, conforme apontam inúmeras pesquisas.
Lamenta-se ainda que, logo após a publicação do texto da mineradora, tenha sido divulgada a publicidade do programa Versos e Preces, apresentado por Dom Vicente Ferreira na TV Horizonte. A proximidade dessa publicidade com o texto da mineradora gera confusão para o leitor. O importante trabalho de Dom Vicente na defesa do meio ambiente e de todos os que sofrem as consequências da devastação provocada pela exploração desenfreada da natureza é reconhecido por todos.
Estejam certos de que a Arquidiocese de Belo Horizonte não concorda com o conteúdo publicado na Revista Ecológico. Permanece firme na defesa da Serra da Piedade e das comunidades que serão impactadas com a exploração sem limites do território.
Assessoria de Comunicação e Marketing

da Arquidiocese de Belo Horizonte

quinta-feira, 11 de abril de 2019

Pela paz, Papa beija os pés de líderes do Sudão do Sul


Pela paz, Papa beija os pés de líderes do Sudão do Sul. O Papa Francisco ajoelhou-se e beijou os pés de líderes do Sudão do Sul que viviam em guerra pelo controle do país. O Pontífice apelou que eles não voltassem a travar uma guerra civil pelo poder. Francisco pediu ao presidente Salva Kiir, seu ex-vice que virou líder rebelde Riek Machar e três outros vice-presidentes que respeitem o cessar-fogo que assinaram e se comprometam a formar um governo de união no próximo mês.
Foto AP
“Imploro que o fogo da guerra se apague uma vez por todas, que possam voltar para suas casas e viver em serenidade. Suplico ao Deus Todo-Poderoso que a paz chegue à terra de vocês, e me dirijo também aos homens de boa vontade a fim de que a paz chegue a seu povo”,
disse o Papa aos líderes do Sudão do Sul. Francisco confirmou o desejo e esperança de proximamente visitar o país

Paz, condição fundamental para o desenvolvimento integral
Desejo dirigir-me a vocês todos com as mesmas palavras do Senhor ressuscitado: “A Paz esteja convosco!”, disse o Santo Padre no início de sua reflexão. “Desejo a mesma saudação a vocês, que vieram de um contexto de grande tribulação para si e para seu povo, um povo muito sofrido pelas consequências dos conflitos”, acrescentou.
“A paz é o primeiro dom que o Senhor nos trouxe e é a primeira tarefa que os chefes das nações devem buscar: ela é a condição fundamental para o respeito dos direitos de todo homem, bem como para o desenvolvimento integral do povo em sua totalidade.”

Particularidade do encontro, num certo sentido, único

Referindo-se à natureza deste encontro de dois dias no Vaticano, o Pontífice destacou que o mesmo é totalmente particular e, num certo sentido, único, por não se tratar de um habitual e comum encontro bilateral ou diplomático entre o Papa e os chefes de Estado e nem mesmo de uma iniciativa ecumênica entre os representantes das várias comunidades cristãs.
A palavra “retiro”, por si mesma, já indica um distanciamento voluntário de um ambiente ou uma atividade para um lugar apartado. E o adjetivo “espiritual” sugere que este novo espaço de experiência “é caracterizado pelo recolhimento interior, pela oração confiante, pela reflexão ponderada e pelos encontros reconciliadores, para poder trazer bons frutos para si mesmos e, consequentemente, para as comunidades às quais pertencemos”, explicou Francisco.

Os pobres são preciosos aos olhos de Deus

“Queridos irmãos e irmãs, não esqueçamos que Deus confiou a nós, líderes políticos e religiosos, a tarefa de ser guias de seu povo: confiou-nos muito, e justamente por isso cobrará muito mais de nós! Pedirá conta de nosso serviço e da nossa administração, do nosso compromisso em favor da paz e do bem realizado para o bem das nossas comunidades, em particular dos mais necessitados e marginalizados, em outras palavras, pedirá conta da nossa vida, mas também da vida dos outros.”
“O gemido dos pobres que têm fome e se de justiça – continuou – nos obriga em consciência e nos empenha no serviço. Eles são pequenos aos olhos do mundo, mas são preciosos aos olhos de Deus.”

Os três olhares do Senhor sobre o apóstolo Pedro

Após ressaltar esse “aos olhos de Deus”, Francisco recordou os três olhares do Senhor sobre o apóstolo Pedro. O primeiro é quando Jesus fixa seu olhar em Simão e lhe diz que dali em diante o chamará de Pedro, sobre cuja “pedra” edificará sua Igreja.
O segundo olhar se dá na tarda noite da Quinta-feira Santa. Após tê-lo negado três vezes, Jesus fixa novamente o olhar nele, tocando seu coração e suscitando a sua conversão. Por fim, após a ressurreição, à margem do lago de Tiberíades, Jesus fixou mais uma vez o olhar sobre Pedro, pedindo-lhe que declarasse seu amor por três vezes e confiando-lhe novamente a missão de pastor de seu rebanho.

Desejo ardente de justiça, reconciliação e paz

Qual é hoje o olhar de Jesus sobre mim? A que me chama? O que o Senhor quer me perdoar e o que pede para mudar em minha atitude? Qual é a missão e a tarefa que Deus me confia para o bem de seu povo? – foram interrogações feitas por Francisco no discurso aos líderes sul-sudaneses.
Por fim, o Papa destacou também o olhar do povo, “é um olhar que expressa o desejo ardente de justiça, de reconciliação e de paz”.

Proximidade espiritual do Papa aos sul-sudaneses

“Neste momento desejo assegurar minha proximidade espiritual a todos seus compatriotas, em particular aos refugiados e aos doentes, que ficaram no país com grandes expectativas e apreensivos, à espera do êxito deste dia histórico”, disse ainda, fazendo um premente apelo:
“Penso incessantemente nessas almas sofredoras e imploro que o fogo da guerra se apague uma vez por todas, que possam voltar para suas casas e viver em serenidade. Suplico ao Deus Todo-Poderoso que a paz chegue à terra de vocês, e me dirijo também aos homens de boa vontade a fim de que a paz chegue a seu povo.”
FONTE: VATICAN NEWS

sexta-feira, 5 de abril de 2019

O nióbio e seu impacto silencioso no Brasil

Explosões na mina de nióbio chinesa em Catalão, Goiás,
impactaram recursos hídricos, qualidade do ar e provocaram
rachaduras nas paredes das casas. (Imagem: ANM)
Do site Diálogo Chino
Reportagem Caio de Freitas Paes

Quando suas chances de vitória ainda eram mínimas, o então presidenciável Jair Bolsonaro vendia o nióbio – material-base de ligas metálicas mais leves, usadas pelas indústrias aeroespacial, armamentista, automobilística, eletrônica e da construção civil— como a grande salvação do Brasil.
Em 2016, durante uma visita à maior produtora do minério no mundo, a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM), Bolsonaro disse que ele poderia ser “mais importante do que o petróleo” e ressaltou a influência positiva da empresa na cidade de Araxá, em Minas Gerais, com construção de casas para trabalhadores e de uma escola para os seus filhos.
“Quisera eu que as demais empresas particulares tivessem esse modelo de gestão”, disse Bolsonaro ao fim da visita. “E mais ainda, as públicas. Seríamos um grande país, com toda a certeza.”
Bolsonaro só tinha uma crítica: a participação de empresas chinesas na extração de nióbio no Brasil, considerada excessiva por ele. A China não só compra mais de um terço da produção brasileira de nióbio, como já investiu mais de 3 bilhões de dólares em sua extração e beneficiamento, desde 2011.

Mas outro lado da história não chamou sua atenção: as antigas e múltiplas denúncias de comunidades no entorno de minas de nióbio, de poluição do ar, contaminação de cursos d’água e doenças. Muito além dos embates geopolíticos e mitos, a produção no Brasil tem causado problemas praticamente desconhecidos.
Sob Bolsonaro, o governo brasileiro também estuda autorizar a mineração em terra indígenas, uma mudança potencialmente lucrativapara empresas interessada em explorar nióbio. A visada reserva Raposa da Serra do Sol, em Roraima, também possui jazidas do minério, por exemplo.
“O cotidiano da mineração no Brasil é feito de contaminações, ‘silenciosas’, que se arrastam por anos e décadas”, diz o frei Rodrigo Péret, membro do Grupo de Trabalho de Mineração da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que acompanha denúncias de contaminação em Araxá

Investimentos chineses

O consórcio China Niobium Investment Holdings Ltd. adquiriu 15% da CBMM em setembro de 2011, em uma operação de 1,95 bilhão de dólares. A empresa é responsável por 75% da produção global do ferronióbio, uma fortalecida liga metálica usada para a fabricação de aços com maior valor agregado.
Em 2018, a CBMM exportou mais de 84 mil toneladas desse produto e a China foi a maior compradora, com 30 mil toneladas. A empresa anunciou recentemente seus planos de expandir sua produção anual para 150 mil toneladas até 2020.
Em 2016, a China Molybdenum (CMOC), uma das maiores produtoras globais de cobre do mundo, arrematou o segundo maior polo produtor de nióbio do mundo nas cidades goianas de Catalão e Ouvidor. Foram 1,5 bilhão de dólares em investimentos nas minas de Chapadão e Boa Vista . Com isso, a CMOC abocanhou 10% da produção global. Hoje, ela também extrai fosfato ali.
A China consolidou sua relação comercial com o estado de Goiás na última década, independente dos impactos e críticas. O total importado dali mais que triplicou em 10 anos: de 736 toneladas em 2005, saltou para 2.729 toneladas em 2015.

“A demanda por nióbio e sua aplicação ao aço tornaram-se estratégicas. Afinal, a China possui megaestruturas de construção civil e investimentos em indústrias de alta tecnologia”, diz Ricardo Fernandes, professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG).
O contexto inspirou, ao menos em parte, a postura anti-China do ex-capitão do Exército, agora presidente. “Não podemos, como fizemos há pouco, entregar o nióbio de Catalão para um país. Pode isso? Isso tem de ser nosso, de empresa brasileira”, disse Bolsonaro pouco após as eleições de 2018, em uma de suas transmissões para apoiadores.

Hegemonia global, danos silenciados

Bolsonaro ficou maravilhado com a atuação da CBMM em Araxá. Porém, ele não mencionou o custo humano dessas operações. Há denúncias de poluição e contaminação, além de impactos sociais sobre comunidades tanto em Minas Gerais quanto em Goiás.
O caso em Araxá, onde a mina está em operação há mais de 50 anos, é o mais duradouro. O episódio mais grave aconteceu em 1982: uma contaminação que ainda não foi completamente remediada e cujos efeitos perduram até hoje.
Naquela época, o processo de extração de nióbio feito pela CBMM produzia uma reação química que gerava cloreto de bário solúvel, então depositado em uma das barragens do complexo minerário.
O bário começou a infiltrar poços d’água que abasteciam a população do bairro Complexo do Barreiro, nos arredores da mina, e também cursos d’água logo abaixo da barragem. A substância pode provocar graves problemas de saúde se ingerida, principalmente por longos períodos.
“A contaminação ocorreu, principalmente, porque rejeitos e efluentes apresentam elevadas concentrações de cloreto de bário, o qual é bastante solúvel e difundiu-se pelo meio subterrâneo em teores mais elevados que o normal, mesmo para esta região”, aponta uma nota técnica de 2015, feita em parceria entre a Fundação Estadual do Meio Ambiente e o Instituto Mineiro de Gestão de Águas para acompanhar a evolução do caso.
empresa diz reiteradamente que o desastre não afetou a Estância Hidromineral do Barreiro, e que a remediação dos poços apresenta resultados concretos. O local é o principal ponto turístico de Araxá, famoso pelo poder medicinal de suas águas e lama.
Desde então, a mineradora mudou seu método de extração de nióbio, no entanto, mais de três décadas depois, a contaminação ainda não foi resolvida. Em 2018, o Ministério Público estadual e a CBMM firmaram um acordo para reparação dos danos ambientais causados.
O acordo foi firmado menos de um mês após o Tribunal de Justiça de Minas Gerais negar, de uma só vez, 517 processos relativos à contaminação de 1982. As ações foram movidas por moradores e ex-moradores do Barreiro contra a mineradora e a Bunge, responsabilizando-as por danos à saúde da população.
Comunidade de camponeses nos arredores da CMOC. (Imagem: Ricardo Gonçalves)
As denúncias e resoluções esbarram no poderio de empresa, conta o Frei Rodrigo Péret. “Pode-se notar a influência política da CBMM em um episódio recente, quando a empresa contribuiu com recursos para a construção da nova sede da Câmara Municipal de Araxá”, disse.
Péret é membro do conselho ambiental da região e tem denunciado problemas problemas em torno da mineração na cidade nos últimos anos.
“A dependência do valor arrecadado, produzido e distribuído pela CBMM em Araxá é total. Com um modelo minerário como esse, é difícil criticar, fazer com que as coisas mudem”, complementa Péret.
Em Goiás, problemas em torno da produção de nióbio também foram denunciados. Fernandes, da UEG, pesquisa o tema desde 2010 — ele também é parte do Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade da Universidade Federal de Juiz de Fora. Como parte de sua pesquisa, Fernandes conduziu estudos na comunidade camponesa de Coqueiros, nos arredores do complexo da CMOC, e coletou críticas da população.
A lista de problemas inclui diminuição no fluxo das águas de córregos e nascentes, degradação do ar, poluição sonora e rachaduras nas paredes das casas, resultantes das explosões na mina Boa Vista.
“Alguns idosos relataram problemas respiratórios, que acreditavam ser agravados por particulados no ar provenientes da mineração”, explica Fernandes. “Além disso, sublinharam as pressões pela venda de terras, ameaçando a memória e as relações de pertencimento das famílias com o local”.
Caio de Freitas Paes é reporter freelancer baseado no Rio de Janeiro

 FONTE: Diálogo Chino